A Lei 24.467 - também conhecida como Lei de PyMEs - gerou um novo tipo societário no nosso país: as Sociedades de Garantia Recíproca (S.G.R.).
Estas sociedades têm como objectivo facilitar o acesso ao crédito às PyMEs e são constituídas por duas categorias de parceiros: participantes e protetores.
Os parceiros participantes são pequenas e médias empresas que podem, cada uma, possuir até 5% do capital social - o qual é representado por ações - e sua participação total não pode exceder 50%. Ou seja, a participação total dos parceiros envolvidos nas S.G.R. deve ser de 50%, enquanto a participação de cada parceiro participante dentro da S.G.R. não pode superar 5% do capital social representado em ações.
Sentado por isso, por ocasião de um parceiro envolvido sair do mercado em busca de crédito, conseguir melhor acesso ao mesmo em tanto se encontra apoiado pela garantia da S.G.R. da qual faz parte. Para clarificar, a PyME apresenta-se perante o Banco Cidade e subscreve um contrato de mútuo, a taxa que conseguiria por si só seria muito superior à taxa que lhe pode obter com a garantia que lhe confere a S.G.R. que, através de um contrato de garantia recíproca, defenda as obrigações que tome a pequena e mediana empresa com outras entidades, tornando-se responsável solidariamente por todas as dívidas contraídas até o montante estabelecido no contrato, renunciando expressamente ao benefício de excussão.
Por que se inclui a palavra "recíproca" no tipo social? A S.G.R. concede uma garantia às dívidas contraídas pelo parceiro participante, no entanto, o que - no momento da celebração do contrato de garantia recíproca - a PyME oferece uma contra-garantia pelos prazos que terá de enfrentar a S.G.R. em virtude da garantia prestada. Geralmente, o contra-garante costuma ser uma pessoa humana, que se constitui em fiador. Então, temos dois fiadores: a S.G.R., que responde pelas obrigações não cumpridas por seu parceiro participante e, o fiador (contra-garante) que responde à S.G.R pelas somas pagas em virtude do aval.
Nos últimos anos, com a constante crise econômica em que se encontra sumida nosso país desde 2018, a quantidade de julgamentos executivos iniciados perante o Fuero Nacional Comercial foi multiplicada pelo incumprimento dos pagamentos por parte do parceiro envolvido na sociedade de garantia recíproca. Para o início do litígio, a S.G.R. apresenta toda a documentação e a contabilização dos pagamentos efectuados ao credor do parceiro envolvido no seu carácter de avalista e, perante a falta de pagamento do parceiro participante e contra-garante, inicia um julgamento executivo contra ambos para satisfazer o seu crédito.
Agora, geralmente, tanto os parceiros envolvidos como os seus contra-garantes (que geralmente são seus proprietários), têm domicílio no interior do país. A sala C da Câmara Comercial começou a gerar uma jurisprudência (não unânime na Câmara) através da qual se equiparava ao contra-garante com um consumidor pela sua condição de pessoa humana, o que gera que se dictem incompetências e o julgamento tenha de se retomar em outra jurisdição, retardando a cobrança da S.G.R. Isto é reprovável de todo o ponto de vista, tanto jurídico como económico.
Primeiro, o art. 1092 do Código Civil e Comercial da Nação estabelece que fica equiparado a consumidor aquele que não faz parte da relação de consumo, mas "como consequência ou em ocasião dela, adquire ou utiliza bens ou serviços como destinatário final...". Ou seja, para que o fiador do parceiro participante seja equiparado ao consumidor e conte com a tutela própria da lei 24.240 tem de estar garantindo uma obrigação principal de uma relação de consumo. É próprio do senso comum que, um contrato de garantia recíproca assinado entre SOCIOS de uma sociedade para aceder ao crédito a fim de promover o comércio do parceiro participante NÃO é uma relação de consumo, é um contrato entre parceiros, repito, no qual não aplica a proteção consomeril.
Nesse sentido, com bom tino, expressou-se a Dra. Maria José Gigy Traynor no caso "Garantizar S.G.R. c/ Exportadora Rio Mendoza S.A. e Outro s/ Executivo - 25854/2019" ao rejeitar a excepção de incompetência interposta pelas demandadas alegando que "admitir está postura, seria não só prejudicial para as PMES, a quem mediante essa lei se pretende beneficiar (lei 24.467:1), mas também contrário ao fundamento último do regime tutelar do consumidor (...)".
Em síntese, num contexto em que as barreiras ao crescimento das PyMES são moeda corrente, é preciso contar com magistrados que conheçam o comércio e apliquem devidamente a lei, para os efeitos de não fazer ainda mais engorroso o acesso ao crédito das mesmas. A manutenção dos entraves à cobrança dos créditos da S.G.R. baseados em plenários que, em particular, são contrários à lei nacional, impede os parceiros protetores de montar estas estruturas e de defender as PyMEs no seu acesso ao mercado de créditos.
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