Jesús Daniel Romero desde Miami Strategic Intelligence Institute para FinGurú
Introdução
O que começou como um bloco econômico emergente —BRICS— se transformou em uma plataforma ideológica utilizada por certos governos latino-americanos para promover narrativas radicais e confrontacionais. Na sua edição de 2025, realizada em Brasília, o fórum foi palco de um discurso antisraelense do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, declarações ambíguas sobre o terrorismo islamista e um silêncio cúmplice diante de atores como Irã, Hamas e Hezbollah.
A América Latina não é estranha ao terrorismo islamista. Os atentados contra a embaixada de Israel (1992) e a AMIA (1994) em Buenos Aires, que deixaram mais de 100 mortos, foram atribuídos ao Hezbollah com apoio logístico do regime iraniano. No entanto, vários governos estreitaram laços com Teerã, ignorando esse legado de violência.
Essa tendência não representa toda a esquerda regional, mas evidencia uma corrente ideológica que adotou a narrativa antiocidental do regime iraniano e a projetou em fóruns multilaterais.
II. Irã e América Latina: uma expansão ideológica e logística
A relação entre Caracas e Teerã foi consolidada com Hugo Chávez e se aprofundou com Nicolás Maduro. Em junho de 2022, ambos os países assinaram um plano de cooperação de 20 anos que abrange petróleo, petroquímica, defesa, agricultura e cultura. O acordo também inclui assistência técnica para a indústria energética e voos regulares entre Caracas e Teerã (Reuters, 2022).
Além disso, o Irã instalou fábricas de drones na Venezuela, transferiu lanchas missêis de design iraniano —utilizadas pela Venezuela para ameaçar a Guiana— e desplegou conselheiros militares para requalificar o pessoal no programa F-16. Técnicos iranianos também trabalharam nas refinarias El Palito e Amuay.
Em fevereiro de 2023, o governo de Lula autorizou a entrada no porto de dois navios de guerra iranianos —o IRIS Dena e o IRIS Makran— no Rio de Janeiro, apesar das advertências do governo estadunidense que alertavam sobre os vínculos do Irã com atividades terroristas e proliferação (Reuters, 2023).
III. Apoio simbólico e cumplicidade discursiva com Hamas e Hezbollah
A Venezuela e a Nicarágua expressaram abertamente apoio ao Hamas, qualificando seus ataques como “resistência legítima”. Lula, por sua vez, evitou condenar diretamente o Hamas e classificou a resposta israelense em Gaza como “genocida”. Essas posturas omitem a responsabilidade direta de grupos terroristas em ataques contra civis e o uso de infraestrutura humanitária para fins bélicos.
A ausência de condenações firmes ou equilibradas legitima, simbolicamente, organizações extremistas, e contribui para uma narrativa que justifica a violência como forma de luta política.
IV. Riscos estratégicos para a América Latina
A penetração iraniana na América Latina representa um desafio estratégico em múltiplas frentes:
Militarização regional: drones, conselheiros militares, tecnologia de defesa iraniana e exercícios conjuntos ameaçam o equilíbrio hemisférico.
Normalização do regime iraniano: visitas navais e diplomáticas servem como mecanismo de legitimação para um regime sancionado.
Deterioração das relações hemisféricas: o Brasil e a Venezuela enfrentam tensões com os Estados Unidos e a UE por seu acercamento a Teerã.
Expansão de redes ilícitas: o Hezbollah continua operando estruturas de lavagem de dinheiro, contrabando e financiamento do terrorismo na região, particularmente na Tríplice Fronteira, como demonstrou o “Project Cassandra” (DEA, 2016).V. O aviso da SOUTHCOM e do Congresso dos EUA
Os comandantes do Comando Sul dos EUA (SOUTHCOM) e do Comando Norte (NORTHCOM) alertaram o Congresso sobre a expansão iraniana. A General Laura J. Richardson (2024) e o Almirante Alvin Holsey (2025) apontaram que o Irã busca fortalecer alianças estratégicas com governos autoritários para estabelecer presença logística, diplomática e operacional no continente americano (SOUTHCOM, 2024; SOUTHCOM, 2025).
Paralelamente, o Congresso estadunidense introduziu o projeto de lei S.842 —“No Hezbollah in Our Hemisphere Act”— para limitar as atividades do Hezbollah e prevenir seu financiamento através de redes criminosas transnacionais (U.S. Senate, 2025).
VI. Conclusão e recomendações estratégicas
A relação entre o Irã e certos governos latino-americanos não pode ser interpretada como neutralidade diplomática. Trata-se de uma relegitimação ativa de um regime sancionado por terrorismo, com impactos reais na segurança regional.
Recomendações:
Incorporar requisitos democráticos e de transparência no BRICS e na CELAC.
Reforçar mecanismos de cooperação antiterrorista, especialmente na Tríplice Fronteira.
Estabelecer limites institucionais a acordos com países sancionados por terrorismo.
Promover uma narrativa diplomática coerente que diferencie apoio político legítimo de cumplicidade com extremismo violento.Referências (APA 7)
● Reuters. (2022, 11 de junho). Irã e Venezuela assinam plano de cooperação de 20 anos. https://www.reuters.com/world/iran-venezuela-sign-20-year-cooperation-plan-state-tv-2022-06-11/
● Reuters. (2023, 27 de fevereiro). Brasil permite que dois navios de guerra iranianos atracarem no Rio apesar da pressão dos EUA. https://www.reuters.com/world/brazil-allows-two-iranian-warships-dock-rio-despite-us-pressure-2023-02-27/
● Departamento de Defesa dos EUA. (2025, 13 de fevereiro). Postura do Comando Norte dos EUA e do Comando Sul dos EUA: Testemunho perante o Comitê de Serviços Armados do Senado [Almirante Alvin Holsey]. https://www.southcom.mil/Media/Special-Coverage/SOUTHCOMs-2025-Posture-Statement-to-Congress/
● Comando Sul dos EUA. (2024, 12 de março). Declaração de Postura do SOUTHCOM ao Congresso [General Laura J. Richardson]. https://www.southcom.mil/Media/Special-Coverage/SOUTHCOMs-2024-Posture-Statement-to-Congress/
● DEA. (2016, 1 de fevereiro). DEA e autoridades europeias descobrem esquema maciço de drogas e lavagem de dinheiro do Hizballah. https://www.dea.gov/press-releases/2016/02/01/dea-and-european-authorities-uncover-massive-hizballah-drug-and-money
Senado dos EUA. (2025). S.842 – Lei “No Hezbollah in Our Hemisphere Act”. https://www.cbo.gov/publication/61416
Jesús Daniel Romero é Comandante Aposentado de Inteligência Naval dos Estados Unidos, e também cumpriu destacadas missões diplomáticas representando seu país.
É Co-Fundador e Senior Fellow do Miami Strategic Intelligence Institute, e autor do best-seller na Amazon ¨ Final Flight: The Queen of Air ¨
Colunista do Diário Las Américas da cidade de Miami, e homem de consulta permanente dos meios de comunicação do estado da Flórida, sobre temas de sua especialidade.
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