Jesús Daniel Romero de Miami Strategic Intelligence Institute (MSI2) para FinGurú
I. Introdução: o Estado capturado
Guatemala não sofre simplesmente de fronteiras porosas; seu Estado foi capturado por redes de corrupção enraizadas nos mais altos níveis do poder. A captura institucional transformou os portos, alfândegas, procuradorias e até mesmo o próprio Ministério da Defesa em plataformas para interesses criminosos e estrangeiros. A consequência é visível nas grandes apreensões de cocaína no exterior que, repetidamente, têm como ponto de origem o território guatemalteco.
Mais grave ainda, fontes de inteligência apontam que altos funcionários, incluindo o próprio ministro da Defesa, estariam envolvidos em operações de venda de propriedades estratégicas a empresas de fachada do Partido Comunista Chinês. Nesse contexto, o crime organizado e os interesses estrangeiros não apenas operam com impunidade, mas parecem estar ditando as verdadeiras políticas de Estado.
II. Cargas massivas com origem em portos guatemaltecos
Em dezembro de 2024, autoridades da República Dominicana apreenderam 9,8 toneladas de cocaína em um contêiner de banana que havia saído de Puerto Barrios, Guatemala, com destino à Bélgica. A empresa Chiquita Guatemala confirmou que o contêiner foi escaneado sem anomalias ao sair, e o governo guatemalteco sustentou que a droga foi introduzida na República Dominicana.
Em junho de 2025, a Espanha apreendeu 1.190 kg de cocaína em 14 contêineres provenientes da Guatemala, camuflados entre papelão reciclado. A operação “Shuko” foi a maior apreensão desse tipo em duas décadas.
Nos Estados Unidos, a CBP interceptou quase 13 kg de cocaína dissolvida em pó de chocolate e mais de 100 kg ocultos em frutas frescas provenientes da Guatemala. Em cada caso, a droga passou por alfândegas guatemaltecas sem ser detectada.
III. Fronteiras vulneráveis, portos entregues
Em 2024, a Guatemala relatou apreensões domésticas de 18,2 toneladas, um aumento de 264% em relação a 2023. No entanto, as maiores apreensões ocorrem fora do país, o que revela grandes falhas, ou cumplicidade, nos controles alfandegários guatemaltecos.
IV. Um ministro sob suspeita
Fontes reservadas indicam que o ministro da Defesa estaria promovendo a venda de propriedades militares estratégicas a empresas ligadas ao Partido Comunista Chinês, utilizando favores administrativos encobertos. Entre os ativos indicados estão centros logísticos e terrenos próximos a portos e fronteiras.
V. Procuradoria cooptada, justiça neutralizada
A procuradora-geral Consuelo Porras foi sancionada pelos Estados Unidos por obstruir investigações anticorrupção. Sob sua gestão, o Ministério Público perseguiu procuradores honestos, juízes independentes e jornalistas como José Rubén Zamora, garantindo impunidade para os níveis mais altos do poder, incluindo qualquer investigação sobre o Ministério da Defesa.
VI. Silêncios que delatam
O mais revelador da crise não é o que se diz, mas o que não se diz. A presidenta do México, Claudia Sheinbaum, não se reuniu com o presidente Bernardo Arévalo após o tiroteio na fronteira em La Mesilla. O ministro da Defesa também brilhou pela sua ausência durante a visita do ex-embaixador Christopher Landau.
Ainda mais reveladora foi sua ausência na viagem presidencial a Taiwan entre 5 e 8 de junho de 2025. O presidente Arévalo visitou Taipei acompanhado pelos ministros das Relações Exteriores e da Economia, sem que se registrasse a presença do titular da Defesa na delegação oficial.
Em vez de reafirmar a soberania diante de uma viagem de alto simbolismo geopolítico, o responsável pela Defesa optou pela ausência, aprofundando as suspeitas sobre sua falta de alinhamento institucional e seus possíveis interesses pessoais.
Enquanto os cartéis cruzam as fronteiras com impunidade e as propriedades estratégicas do Estado são negociadas em silêncio, os responsáveis por defender a soberania permanecem atrás de gestos vazios e agendas simuladas.
Esses silêncios não são diplomacia. São cumplicidade.
VII. Conclusão: não importa quantas visitas diplomáticas cheguem
Apesar da chegada de delegações de alto nível dos Estados Unidos – secretários, subsecretários e funcionários do Departamento de Estado – não se conseguiu impedir a corrupção nem romper o pacto de impunidade entre alfândegas e o Ministério da Defesa.
Enquanto a corrupção continuar a vencer, a Guatemala não poderá proteger suas fronteiras, nem garantir sua soberania, nem se desvincular do narcotráfico internacional.
Referências
Agência EFE. (2025, 26 de maio). Bernardo Arévalo visitará Taiwan e Japão em junho para reforçar as relações bilaterais [Artigo]. Destino Panamá.
Arévalo, B. (2025, 2 de junho). Presidente Arévalo da Guatemala inicia viagem a Taiwan e Japão em busca de investimentos e turismo [Artigo]. ContextoHN.
Prensa Libre. (2025, 4 de junho). Bernardo Arévalo chega a Taiwan para se reunir com o presidente William Lai e assinar uma carta de cooperação.
Prensa Libre. (2025, 6 de junho). A China reage após a visita de Arévalo a Taiwan e pede a Guatemala que tome em breve a decisão correta.
Jesús Daniel Romero é Comandante Aposentado de Inteligência Naval dos Estados Unidos e também cumpriu destacadas missões diplomáticas para seu país.
Ele liderou equipes interagências em investigações complexas sobre a atuação dos cartéis de narcotraficantes na América Central.
É Co-Fundador e Fellow Sênior do Miami Strategic Intelligence Institute e, como escritor, seu livro “Final Flight: The Queen of Air” se tornou um best seller nas vendas da Amazon. Atualmente, ele está escrevendo uma trilogia de livros que inclui temas como O Trem de Aragua, os narcoestados e as diferentes estratégias utilizadas pelos narcotraficantes para mover suas cargas.
Jesús é um homem de consulta permanente em temas de sua especialidade por parte dos meios de comunicação do estado da Flórida e é colunista do Diário Las Américas da cidade de Miami.
Comentários