15/05/2023 - politica-e-sociedade

Música oculta: Reggaeton, juventude e silêncio

Por adrian guzmaroli

Música oculta: Reggaeton, juventude e silêncio

A música é uma manifestação artística e cultural que partilhamos os seres humanos, é o maior estímulo que temos para nos comunicar através do som e poder nos expressar. Por meio da história cultural podemos estudar as representações e práticas sociais que se dão através da música.

Neste ensaio vou usar a música chamada mainstring, popular ou “a má chamada música jovem. Muitas vezes ouvimos o debate como frases echas como por exemplo: “que música era a de antes”,”que as canções de antes falavam de amor e não de sexo”, que a música de antes tinha uma mensagem e algo porque lutar”. Todas as épocas e toda a geração ouviram essa frase. Mas nunca perguntamos realmente porque a música influencia tanto as jovens? A suposta “música jovem” por que tem uma má imagem a comparação de outras? Neste trabalho, tomei como caso o reggaetão um gênero Nascido nos bairros pobres de Porto Rico, foi combatido em seus inícios, acusado de corruptor e de promover o perreo, um baile considerado soez. Mas, com o tempo, se expandiu até se tornar um sucesso mundial e o principal produto de exportação musical de Porto Rico.

Primeira parte: desnaturar a suposta música jovem

Antes de contar um pouco como surge este ritmo urbano, temos de pensar como se apresenta o conceito de juventude e de que maneira a música influencia a juventude em todo o mundo.

A juventude é produto de um longo processo histórico, que ainda permanece aberto.

Embora a figura do jovem possa se rastrear desde as sociedades primitivas às primeiras civilizações do Mundo Antigo, não cobriu importância até a modernidade. Para colocar um exemplo na Idade Média, além de a esperança de vida estar em torno dos 40 anos, a ideia de juventude não correspondia ao que é agora, e chamava-se jovens a todos os que não eram nem crianças nem idosos.

A invenção da juventude 1875-1945, o jornalista Jon Savage explica que a palavra “adolescente” começa a ser usada nos EUA. EUA. Após a Segunda Guerra Mundial para os jovens entre 14 e 18 anos. Não funcionou.

Como etiqueta geracional se não sobretudo como uma ferramenta publicitária e comercial. O adolescente como consumidor era uma oportunidade para uma Europa muito atingida pela guerra. Segundo explica o autor, o fato de que a juventude passará a ser considerada como um target de mercado também significava que se tinha tornado um grupo de idade com seus próprios rituais, direitos e demandas.

Em 1904, o conceito de adolescência foi introduzido pela primeira vez da mão do psicólogo e educador americano G. Stanley Hall, que atribuiu características biológicas e psicológicas específicas aos jovens entre 14 e 24 anos. Este modelo foi reforçado por Sigmund Freud, que entendia a adolescência como um período não só problemático, mas também universal, comum a todas as sociedades.

Segundo a OMS, a adolescência é um período de preparação para a idade adulta durante o qual ocorrem várias experiências de desenvolvimento de suma importância. Além da maturação física e sexual, essas experiências incluem a transição para a independência social e econômica.

O desenvolvimento da identidade, a aquisição das aptidões necessárias para estabelecer relações de adulto, assumir funções adultas e a capacidade de raciocínio abstrato. Embora a adolescência seja sinônimo de crescimento excepcional e grande potencial, constitui também uma etapa de riscos consideráveis, durante a qual o contexto social pode ter influência determinante. Mas como a música influencia e os adolescentes

No processo de criação e consolidação da identidade pessoal, os adolescentes se unem a grupos com afinidades semelhantes. Dessas uniões grupais surgem amizades, peças-chave na formação importante na aprendizagem emocional e na cultura, podendo chegar a influenciar costumes e emoções.

Acontece com frequência que os adolescentes substituem a dependência familiar pela dependência grupal.

A etapa da adolescência caracteriza-se pela identidade e confusão; ocupa o quinto estágio do processo de formação da identidade. Cabe ressaltar que é o momento chave no qual o adolescente busca seu lugar dentro da sociedade. A música representa em muitos casos a crença dos grupos sociais, determinando a maneira de se mover, falar e vestir.

No momento em que lei isso me fez lembrar um texto do antropólogo Pablo Semán música e juventude hegemônica:crítica de uma recorrência que pergunta.

A música é uma atividade predominantemente juvenil? A juventude é predominantemente musical? Seman marca nisso que a relação entre a música e a juventude é subestimada quando falamos sobre o que é ser jovem. Mais importante ainda, esta suposição não deixa de influenciar a conexão entre o conceito e as ideias emergentes. Às vezes a imagem que temos dos jovens se torna infantil e empobrecida.

Seman nos coloca que nos esquecemos o que pode ajudar a "expressá-lo musicalmente" ou "identificar-se socialmente através da música" aos jovens. Sob este conceito de "identificação" - isto é, a razão pela qual os "jóvenes" que deveriam aproximar-se da música. Para isso Seman levanta duas problemáticas que não temos na hora de falar de música jovem ou popular.

Primeiro, e por várias razões, parece que é problemática a existência de uma "música jovem" e isso não é de nenhuma maneira assim.

Há muitas músicas jovens e os "jóvenes de hoje" têm um menu "infinito" em suas opções e complexidade de combinação. Se a música é parte da educação sentimental (...) as gerações contemporâneas (...)Na atualidade "uma música", uma mesma música, tem sido parte, de formas diferentes, de várias "juventudes". Nossos familiares mais próximos de pequenos nos puseram música quando era adolescentes.

Isso milhares jovens fica com esse legado musical influenciando sua própria juventude, mas como diz o autor cada jovem encontra um sentimento diferente em cada gênero musical e que se possa apropriar da música, usá-la como um meio de expressão ou encontrar sua própria voz.

Aca vai o segundo problema que levanta seman:

É importante enfatizar que “juventud” significa uma relação diversa e complexa com a idade, e também expressa, valor em diversas formas, e não há consenso sobre forma e conteúdo. Há muitos jovens na música, e os jovens também têm muitos corpos musicais, é a música que ajuda a produzir jovens diferentes e constrói o ciclo de vida e sua divisão de diferentes formas. Muitas vezes se diz que a "juventud" é a categoria de construção social.

No entanto, quando o estudo de mercado é dirigido a indivíduos entre 15 e 30 anos e a (fusão) integração de pressões sociais secundárias com as características básicas dos jovens, não está claro em que medida este nobre princípio foi perdido.

A noção contemporânea de "juventud" não pode ser estudada se não se recupera a contingência radical do contexto de lutas pela definição de juventude e ciclo de vida.

Pode-se assinalar momentos que têm um fator musical e criam valores de "juventud" sem importar a idade, ou fazem circular música que permite estabelecer pontes entre várias gerações, redefinindo o próprio da juventude. Os valores que ordenam as frações de idade e que se atribuem a cada uma delas variam muito quanto o olhar pára em práticas musicais específicas e nos eventos em que a música é utilizada para fins recreativos e ao mesmo tempo identitários.

Desnaturalizado um pouco os conceitos música e juventude vou começar a contar de cheio a história do reggaeton pondo em conta tudo o que viemos contando.

Segunda Parte História do Reggaetão

O reggaeton é um gênero musical que deriva do reggae e do dance hall, bem como elementos principalmente do hip hop e da música latina. É um gênero musical muito popular até hoje.

O Reggae da Jamaica e seu ritmo marcam o início da história deste gênero. A imigração de cidadãos jamaicanos para finais dos anos 70 para porto rico ou panamá fez com que sua música fosse tocada em outras línguas. Nesse momento, começaram a se desenvolver tanto a música latina como o som jamaicano.

Ele criou uma fusão de ritmo e linguagem. Por um lado, os produtores Steely & Clevie da Jamaica criaram um ritmo ao qual chamaram DemBow.

A palavra dembow é usada atualmente para definir o ritmo característico que conforma a base do reggaetão. No entanto, em seus inícios tinha um significado bem diferente. O primeiro a usar esse ritmo foi o jamaicano Shabba Ranks, cantor de dance hall, em uma de suas canções mais famosas: DemBow (1991). Em patois jamaicano significa ‘eles se inclinam’ (parecido ao inglês they bow), e Ranks o usa para se referir aos homens homossexuais de maneira denigrante. “Leva a mão se você sabe que não te inclinas” repete o estribillo. Mas a canção vai além: a letra, além de homófoba, tem um alto conteúdo anticolonialista. “Liberdade para as pessoas negras / Isso quer dizer que os opressores se inclinam (...) Agravias ao seu irmão negro, quer dizer que te inclinas / Odias à sua irmã negra, quer dizer que te inclinas”. Basicamente, Ranks insulta o racista e opressor chamando-o gay.

No mesmo ano, dois cantores panamenhos traduziram a canção de Shabba Ranks para o espanhol. Nando Boom a titularizou eles Benia, e o General chamou-a Son Bow. Além da mudança de título, a letra mantém o conteúdo homófobo e anticolonialista: neste caso, ambos cantam que nem Jamaica, nem Panamá, nem Porto Rico nem Colômbia são “bow”, ou seja, são gays. O caminho percorrido pela canção Dem Bow que batizaria o famoso ritmo reggaetonero é um bom exemplo das dinâmicas sociais e culturais que se viviam na região. O vínculo entre Jamaica e Panamá começou quando migrantes da ilha caribenha se deslocaram ao istmo para trabalhar na construção do Canal do Panamá.

Desde então, o fluxo musical entre ambos os países tem sido intenso, e vários cantores, como Nando Boom e El General, se dedicaram a traduzir canções de reggae e dance hall ao espanhol. Nando Boom publicou um disco que bautizou Reggae Espanhol, onde entre outras coisas cantava explicitamente contra o racismo. Na canção nos chamam imigrantes — na qual, além disso, se identifica um já ritmo próximo ao futuro reggaeton — o cantor diz o seguinte: “Nos chamam imigrantes porque vivemos na América (...). Derrotemos o racismo, temos que lutar, temos que nos unir entre irmãos”. Esse reggae de fala hispânica é uma das sementes que depois faria florescer o reggaetão. No entanto, foi em Porto Rico onde o gênero cristalizou. Com uma orelha colocada no hip hop dos Estados Unidos — e especialmente de Nova Iorque — a ilha viu nascer uma geração de rappers boricuas que preencheram os bairros periféricos de São João, a capital, em meados da década de 1990. Mas fizeram isso com sua idiosincrasia caribenha particular, rapando sobre bases musicais bem diferentes das que usavam seus companheiros nova-iorquinos. Entre elas estava o dembow, esse ritmo que se amplificava desde a Jamaica e o Panamá. Na verdade, os primeiros reggaetoneros porto-riquenhos foram chamados rappers, e o gênero que anos depois se popularizaria em todo o mundo levava o nome de melaza, música negra ou música underground. Esses nomes explicitam como o reggaetão incipiente estava intimamente ligado a questões de classe e de raça: havia se tornado um alto-voz para as comunidades marginalizadas, majoritariamente afros latinos.

A fusão foi muito popular nas discotecas da ilha, caracterizadas por sua letra muito forte e linguagem explícita, estendendo-se pouco a pouco entre a juventude local.

A fusão crescia com sucesso, mas de forma clandestina, já que era perseguida pelas autoridades. O objetivo era regular as letras e imagens de vídeo do reggaeton. Também o era moderar os alegados excessos da dança que geralmente acompanhava, conhecido como perreo, que se caracteriza pela sensual maneira como os participantes se restriegan uns contra outros ao são do ritmo de origem jamaicano chamado dembow.

Desde o início, foi produzido por e para a juventude urbana das classes mais pobres. Mas já para meados da década de 90 as letras sexualmente explícitas do reggaetão e suas crônicas da violência cotidiana chegaram a ouvidos classe média alta, que respondeu ao novo gênero musical de bairros baixos.

O Estado Portorriquenho, que enfrenta uma onda criminosa sem precedentes e incontrolável, colocava o reggaetão como o culpado de todos os males se associava aos cidadãos de classe baixa sua “suposta” predisposição para a violência e a depravação sexual.

Em 1995, o Esquadrão de Controle do Vicio da Polícia de Porto Rico, com a ajuda da Guarda Nacional, tomou a iniciativa sem precedentes de confiscar gravações de lojas de música, alegando que as letras de reggaeton eram obscenas e promovia o uso de drogas e o crime.

Sob essa justificativa, a polícia confiscou fitas de cassette com gravações e multou os locais que reproduzem esse tipo de música. Esta criminalização fazia parte da campanha “Mano dura contra o crime” que começou em 1993 e que foi instaurada sob a liderança do governador Pedro Rosselló, que é nem mais nem menos que o pai do recentemente deposto Ricardo Rosselló. Um dos rappers boricuas, Eddie Dee, lembrava-o bem em seu reggaeton Censurame(2004):

Muitos me olham como se eu fosse um tipo sem arranjo

Como se nunca tivessem visto um negro

Como se fosse um criminoso

Como se com o lápis e com a minha livraria eu matar pessoas

(...)

Os que nos criticam

Esta é a música com que os jovens se identificam

Censurarme por ser rapper

É como censurar um povo inteiro.

O Departamento de Educação da ilha juntou-se a estes esforços e proibiu a música underground e a roupa holgada, em uma tentativa de eliminar a praga da cultura hip-hop das escolas.

Uma vez que o reggaetão rebasou as fronteiras dos bairros pobres, sua repressão também se tornou impossível por outra razão: o reggaetão era "real". Ao contrário do comercializado e saneado rap em espanhol e do molho romântico que substituiu as letras bairro central do período clássico, o reggaeton fazia referência direta às condições sociais prevalecentes no país: taxas de desemprego de até 65% em algumas zonas, um sistema educativo pobre, corrupção governamental e violência vinculada ao narcotráfico. Embora os funcionários do governo tratem de culpar a música por muitos desses problemas, a geração do reggaeton entendeu que a linguagem crua, a sexualidade explícita e as crônicas de rua não eram mais obscenas, violentas ou moralmente questionáveis que o estado geral do país.

No entanto, o status do reggaetão mudou com os anos, especialmente quando em Porto Rico os artistas começaram a sortear a censura com letras menos explícitas, tanto a nível de conteúdo violento e sexual como a nível político. Graças a isso e ao crescente esforço de produtores latinos como Luny Tunes, o reggaeton começou a ser considerado um gênero cada vez mais mainstream.

Um dos marcos mais importantes e que iniciou a febre global do reggaetão foi a acertadamente intitulada "Gasolina", de Daddy Yankee, onde cantava as mulheres de uma perspectiva muito machista onde objetiviza a mulher. Esta canção, e seu sucesso fenomenal, pareciam ter surgido do nada, mas Parabéns para uma indústria do disco, que tinha procurado desesperadamente o próximo produto para vender no mercado urbano juvenil. A esperança de que o reggaetão fizesse pelos latinos o que o hip-hop tinha feito pelos afro-americanos provocou uma onda de mudanças na indústria.

A chegada de Calle 13 ao reggaeton também representou uma mudança significativa em outros sentidos. Embora Calle 13, como outros reggaetoneros, costuma se concentrar em temas relacionados à sexualidade, racismo e violência da vida nos bairros, seu vocalista, Residente, também se autodesigna como o "sistema digestivo da nação", transformando o lixo do desejo e a política em uma nova linguagem para criticar a sociedade e a política.

Embora hoje os reggaetoneros estejam fazendo mais canções de base tecno, hip-hop, r&b e baladas pop, entre outros gêneros.

Reflexões Finais:

O gênero do reggaetão não é um passatempo inofensivo, inocente ou ingênuo, pois incita o público a formar uma opinião crítica sobre a ordem social.

Isso pode ser comparado com um ritmo muito próximo da Argentina a Cumbia base(villera). Que Surge na segunda metade dos 90, como um gênero que coloca em jogo os jovens dos bairros mais pobres da Argentina O adjetivo “villero”, utilizado com menospreço para caracterizar os habitantes das vilas, os assentamentos mais pobres das cidades de todo país, é levantado com orgulho e recuperado como marca diferencial dentro deste gênero. Ser villero é, no olhar dos “outros” ser pior do que apenas ser pobre se não um ocioso, criminoso, viciado e sem futuro.

O que faz esses é visibilizar e criticar o contexto social de crise de cada país dando oportunidade jovens cantores de mostrar um olhar da realidade que se negava e se ocultava embora na Argentina não houve perseguição política da cumbia villera, gerou-se o desprestigio social.

Esses gêneros deram voz e identificaram milhares jovens que buscam a maneira de se sentir identificados de alguma maneira. Em fim deconstruamos, descuidemos, e desinstalamos.

O que permitirá que assumam um novo argumento frente à realidade cultural.

A música é um reflexo da sociedade e um recorte da realidade, não deixemos de analisar criticar esses gêneros apenas não deixarmos de lado como surgiram e porque surgiram.

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adrian guzmaroli

adrian guzmaroli

Olá, me chamo Adrián Ezequiel Guzmaroli nascido em 29/01/1997 em Rosario. Hoje estou estudando o professorado do nível superior de história.

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