William Acosta, CEO da Equalizer Investigations, para Poder & Dinero e FinGurú
Introdução: Onde as fronteiras desenham outras realidades
A fronteira que une —e separa— a Colômbia e a Venezuela é muito mais do que um ponto no mapa. Às vezes, parece mais uma ferida viva, marcada por tensões políticas, desejos de integração e a crua evidência de economias clandestinas e violência. A criação de uma Zona Binacional de Paz, União e Desenvolvimento Econômico, como anunciado pela Presidência da Colômbia, à princípio pareceria um avanço, mas trouxe consigo uma nova onda de dúvidas e temores (Presidência da Colômbia, 2025). Os mapas publicados pelos meios de comunicação deixam claro o impacto do projeto, que atravessa regiões historicamente vulneráveis como La Guajira, César, Norte de Santander, Arauca, Vichada e Zulia. Destas zonas, cresce a preocupação de que, em vez de trazer desenvolvimento, sirva de plataforma para que redes criminosas consolidem rotas de ilegalidade (France24, 2025).
Enquanto o discurso governamental repete ideias de integração e crescimento, muitos especialistas, entre eles Carlos Augusto Chacón, insistem na lâmina dupla do projeto: a possibilidade de que seja uma cortina de fumaça capaz de cegar o movimento de capitais ilícitos e proteger máfias binacionais com respaldo diplomático (NTN24, 2025; Diário Las Américas, 2025; Chacón, 2022).
O debate se intensifica pela percepção de engano no discurso oficial do presidente Gustavo Petro. Segundo vários analistas e reportagens jornalísticas, o mandatário usa a linguagem da paz e da cooperação para disfarçar o que realmente ocorre: uma proliferação de estruturas criminosas, alianças opacas e rotas de tráfico que se fortalecem à sombra da nova ordem jurídica binacional (Diário Las Américas, 2025; NTN24, 2025).
Como expressa Chacón:
“Estamos observando como a fronteira se dilui, deixando a um Estado criminalizado —como o venezuelano— o campo livre para operar, colocando em dúvida a soberania da Colômbia. Não se trata de cooperação, mas sim de criar uma zona cinza onde as máfias assumem o controle, cobertas por um discurso de integração.” (Chacón na NTN24, 2025)
Acordos sem transparência e os protagonistas nos bastidores
Entre os nomes que assinam o memorando estão Diana Morales Rojas e Alfredo Saade pela Colômbia, junto a Delcy Rodríguez Gómez, Coromoto Godoy e Yván Gil pela Venezuela. À frente de ambos os governos, Gustavo Petro e Nicolás Maduro avalizam o pacto (Presidência da Colômbia, 2025; France24, 2025). No entanto, o que acontece longe da formalidade das assinaturas e das fotos suscita grande inquietação. Especialistas alertam que os verdadeiros beneficiários podem ser organizações com interesses obscuros, cujo blindagem legal se fortalece sob a retórica da integração (Chacón na NTN24, 2025; Diário Las Américas, 2025).
A fronteira viva: uma terra fértil para o crime
Esta faixa não é apenas uma passagem comercial: é um espaço onde décadas de abandono institucional deixaram campo aberto à proliferação de grupos criminosos, guerrilhas e funcionários corruptos. As investigações de Chacón e outros especialistas identificam três pontos críticos:
• As rotas ilegais podem funcionar ainda melhor, facilitando o tráfico de drogas, armas, combustível e pessoas, dominadas por bandas como o Cartel dos Soles (Chacón na NTN24, 2025; Wikipedia, 2023; Infobae, 2025).
• A lavagem de dinheiro é facilitada pelas novas normas binacionais, favorecendo o aparecimento de empresas de fachada e bloqueando controles fiscais (CNNE, 2025; Departamento do Tesouro dos EUA, 2025).
• Um novo arcabouço jurídico pode ser utilizado para evadir investigações e sanções, usando a diplomacia como um escudo de impunidade (DW, 2025; Chacón na NTN24, 2025).
Grupos terroristas e o papel do Estado
O corredor fronteiriço tem sido um campo fértil não só para máfias, mas também para agrupações consideradas terroristas que, com a tolerância e até cumplicidade de funcionários oficiais, encontraram abrigo e novas oportunidades de expansão:
• O Exército de Libertação Nacional (ELN) estendeu sua influência do lado venezuelano, recebendo proteção, recursos e liberdade de ação em vastas áreas, muitas vezes com a anuência de autoridades do regime de Maduro (DW, 2025; El País, 2025; Diário Las Américas, 2025).
• As dissidências das FARC, sobretudo ‘A Nova Marquetalia’ e o ‘Estado Maior Central’, reconstruíram suas redes armadas e logísticas em ambas as margens do rio, contando com abrigo seguro, treinamento e oportunidades comerciais ilegais graças à sua relação com o governo da Venezuela (El País, 2025; Wikipedia, 2023).
• Organizações internacionais alertaram sobre a presença do Hezbollah e suas operações econômicas na região: financiamento ilícito, lavagem de ativos e participação no tráfico transfronteiriço, atividades que só são possíveis com proteção política e total falta de controle estatal (Departamento do Tesouro dos EUA, 2025; Diário Las Américas, 2025).
• O Trem de Aragua e numerosas bandas paramilitares venezuelanas agem com métodos terroristas, usando violência e extorsão, e operam com a aprovação —ou ao menos a indiferença— de corpos estaduais (DW, 2025; Infobae, 2025).
Tudo isso configura um cenário em que os governos, especialmente o da Venezuela e em parte o colombiano, terminaram sendo cúmplices diretos ou indiretos da expansão de grupos violentos nacionais e internacionais (Chacón, 2022; Diário Las Américas, 2025).
Uma ameaça direta à segurança dos Estados Unidos
Embora o drama fronteiriço afete especialmente Colombia e Venezuela, os tentáculos do conflito chegam muito mais longe. Documentos do Departamento do Tesouro dos EUA e numerosas reportagens colocam em pauta como o corredor serve como uma autoestrada para o transporte de drogas, armas e dinheiro para o norte, fomentando a criminalidade em território americano. Os cartéis mexicanos atuam como ponte e, junto a máfias e terroristas locais, geram uma rede que culmina no aumento da violência, lavagem de ativos e crime transnacional com impacto direto na segurança nacional dos Estados Unidos (Departamento do Tesouro dos EUA, 2025; Reuters, 2020; El País, 2021).
Quem detém o controle real do corredor
O poder não está nem nos governos nem nas mesas de negociação, mas sim nas mãos de quem domina as rotas. Pelo lado colombiano aparecem o ELN, grupos residuais do EPL (Os Peluzos), Los Puntilleros e o Clan do Golfo; na Venezuela e na zona intermediária atuam o Cartel dos Soles, Trem de Aragua, coletivos armados e as poderosas dissidências das FARC, com alianças flexíveis/temporárias segundo os interesses do momento (Wikipedia, 2023; Infobae, 2025; DW, 2025; El País, 2025).
O papel dos cartéis mexicanos
A rede de tráfico de drogas que cruza esta fronteira já não está apenas ao serviço de compradores estrangeiros: os grandes cartéis mexicanos —Sinaloa, CJNG, Los Zetas, Beltrán Leyva— investem na produção local, fornecem armamento e pessoal, e estabelecem células próprias para garantir o fluxo constante de carregamentos para a América Central, o Caribe e o território americano (Reuters, 2020; Infobae, 2020; El Clip, 2023; BBC Mundo, 2024; El País, 2021).
Cumplicidade e corrupção como engrenagem
O funcionamento de toda essa maquinaria ilegal é impossível sem a facilitação, encobrimento e até participação direta de funcionários do Estado —policiais, militares, burocratas— a quem se documentou favorecendo o trânsito de cargas ilegais, ocultando evidências ou lavando dinheiro sob contratos e pactos de mútua ajuda (Razón Pública, 2025; Inseroca, 2025; Chacón na NTN24, 2025).
O Cartel dos Soles e o regime venezuelano
O Cartel dos Soles, com vínculos nas mais altas esferas do governo venezuelano, chegou a controlar toda a cadeia do negócio: desde a produção rural e o transporte por rios ou estradas até a saída internacional a partir dos portos venezuelanos. A nova ordem binacional lhes concede legitimidade e margem operacional nunca antes vista, consolidando um poder econômico e político de grande alcance (Departamento do Tesouro dos EUA, 2025; DW, 2025; Infobae, 2025; Diário Las Américas, 2025).
Conclusão: Uma fronteira que ainda dói
A Zona Binacional, longe de ser um sucesso integrador, evidencia fraquezas estruturais que favorecem a expansão de máfias, terroristas e redes de corrupção. O discurso complacente, ambíguo e frequentemente enganoso do presidente Petro oculta realidades extremamente alarmantes. A rota continua nas mãos de quem comercializa com a vida e a segurança de milhões, levando o caos além da América Latina para se tornar um problema de segurança hemisférica, principalmente para os Estados Unidos. A única saída real é a erradicação dos laços entre crime e poder, a exigência de transparência e a recuperação do Estado de Direito para quem vive, resiste e sonha na fronteira (Chacón na NTN24, 2025; Diário Las Américas, 2025; Departamento do Tesouro dos EUA, 2025).
REFERÊNCIAS
• Chacón, C. A. (2022, 18 de novembro). O regime de Maduro e o ELN buscam legalizar a criminalidade fronteiriça: entrevista com Carlos Augusto Chacón. Instituto de Ciência Política.
https://www.institutodecientificapolitica.org/entrevista-carlos-chacon
• NTN24. (2025, 25 de julho). “Uma zona cinza onde grupos criminosos começam a assumir de fato todo um controle com o apoio de um Estado”: Carlos Chacón sobre zona binacional entre Colômbia e Venezuela.
https://www.ntn24.com/america-latina/colombia/chacon-zona-binacional-petro-maduro-614550
• Diário Las Américas. (2025). A faixa do crime criada por Petro e Maduro.
• Crisis Group. (2020, 14 de dezembro). Desordem na fronteira: mantendo a paz entre Colômbia e Venezuela.
• Departamento do Tesouro dos EUA. (2025, 26 de julho). Treasury Sanctions Venezuelan Cartel Headed by Maduro.
https://home.treasury.gov/news/press-releases/jy1203
• Presidência da Colômbia. (2025). Colômbia e Venezuela assinam Memorando de Entendimento para criar a Zona de Paz, União e Desenvolvimento Econômico.
• France24. (2025, 26 de julho). Do que se trata o acordo entre Colômbia e Venezuela para criar uma zona binacional?
• Razón Pública. (2025). Corrupção e crime na fronteira colombo-venezuelana.
https://razonpublica.com/frontera-crimen-colombia-venezuela/
• Kaosenlared. (2025). Narcotráfico e economias ilegais na fronteira colombo-venezuelana.
https://kaosenlared.net/narcotrafico-economias-ilegales-frontera-colombia-venezuela/
• Wikipedia. (2023). Narcotráfico na Colômbia e na Venezuela.
https://es.wikipedia.org/wiki/Narcotráfico_en_Colombia
• Infobae. (2025). Nova zona de crime na fronteira.
https://www.infobae.com/colombia/2025/07/26/nueva-zona-crimen-frontera-petro-maduro/
• CNNE. (2025). Lavagem de dinheiro na zona binacional.
https://cnnespanol.cnn.com/2025/07/26/blanqueo-capitales-zona-biunacional/
• DW. (2025). Marco legal e crime transnacional.
https://www.dw.com/es/marco-legal-binacional-crimen-transnacional/a-69760172
• Defensoría del Pueblo. (2025). Alianças criminosas na fronteira.
https://www.defensoria.gov.co/alianzas-criminales-frontera
• El País. (2025). Dissidências das FARC e alianças estratégicas.
https://elpais.com/internacional/2025-07-26/disidencias-farc-alianzas-frontera.html
• El Clip. (2023). Cartéis mexicanos e a fronteira.
https://elclip.org/carteles-mexicanos-frontera-colombia-venezuela
• BBC Mundo. (2024). Narcorutas da fronteira colombo-venezuelana.
https://www.bbc.com/mundo/noticias-america-latina-68896110
• Reuters. (2020). Colômbia, Venezuela e os cartéis mexicanos.
https://www.reuters.com/article/colombia-venezuela-carteles-idLTAKBN23X2A9
• Inseroca. (2025). Funcionários corruptos na fronteira.
https://inseroca.com/funcionarios-fronterizos-corrupcion
• YouTube/CJNG Invade Colômbia. (2025).
https://www.youtube.com/watch?v=CJNG-Invade-Colombia
• Diário Las Américas. (2025). Poder econômico e criminalidade na fronteira.
https://www.diariolasamericas.com/america-latina/poder-criminal-frontera-colombia-venezuela-n5330192
Sobre o autor:
William L. Acosta é graduado pela (PWU) e pela Alliance University. Ele é um oficial da polícia aposentado da cidade de Nova York, além de fundador e diretor executivo da Equalizer Private Investigations & Security Services Inc., uma agência licenciada em Nova York e na Flórida com alcance internacional. Desde 1999, ele tem conduzido investigações em casos de narcóticos, homicídios e pessoas desaparecidas, e tem participado da defesa criminal tanto em nível estadual quanto federal.
Especialista em casos internacionais e multijurisdicionais, ele coordenou operações na América do Norte, Europa e América Latina.
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