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À beira de uma maré vermelha: As eleições do Chile 2025 e o risco estratégico de uma vitória comunista

Por Miami Strategic Intelligence Institute

À beira de uma maré vermelha: As eleições do Chile 2025 e o risco estratégico de uma vitória comunista

José Adán Gutiérrez, Pesquisador Sênior, MSI2 e Claudio Niada, empresário para FinGurú

As eleições chilenas do próximo 16 de novembro de 2025 não são uma disputa eleitoral comum: representam um ponto de inflexão histórico para o futuro político, econômico e estratégico do país. Pela primeira vez, toda a esquerda se alinhou atrás de uma candidata do Partido Comunista, Jeannette Jara, que lidera ou empata na maioria das pesquisas com seu principal concorrente da direita José Antonio Kast.

Por outro lado, a direita está dividida em dois blocos irreconciliáveis, enquanto o centro político entrou em colapso e cedeu seu apoio à opção abertamente comunista, que se denomina estrategicamente e comunicacionalmente de centro-esquerda para atrair eleitores ingênuos.


Com o sistema D’Hondt, que favorece listas unificadas, e com o controle do Congresso em jogo, existe um risco real de que a esquerda obtenha maiorias legislativas que possam modificar a Constituição e consolidar um regime ideologicamente alinhado com a Venezuela ou Cuba. Esta análise detalha os riscos, as divisões internas, os erros estratégicos e os sinais de alerta tanto cidadã quanto política que poderiam ser ignorados a um custo muito alto para a democracia chilena e suas futuras gerações.

Uma vitória do Partido Comunista no Chile não apenas transformaria radicalmente o país, mas também marcaria uma vitória simbólica e estratégica para a República Popular da China no continente. Permitiria a Pequim contar com um parceiro confiável e alinhado no Cone Sul, consolidando sua influência sobre setores críticos como o lítio, a energia, a infraestrutura marítima e as telecomunicações. Além disso, enviaria um sinal poderoso a toda a América Latina, alterando o equilíbrio geopolítico hemisférico em detrimento dos interesses dos Estados Unidos. A vitória de um governo comunista no Chile teria reverberações em todo o continente, enfraquecendo o bloco democrático e fortalecendo o avanço de regimes autoritários alinhados com a China.

1. Jeannette Jara: Uma candidata comunista com projeto de transformação ideológica

Jeannette Jara, figura proeminente do Partido Comunista do Chile (PCCh), venceu as primárias presidenciais da esquerda com um apoio esmagador (Reuters, 2025a). Longe de se moderar, reafirmou seu compromisso com uma agenda de cunho marxista-leninista, baseada em:

• Eliminação do sistema privado de pensões (AFP).

• Nacionalização do lítio e expansão do papel do Estado em setores estratégicos.

• Reforma tributária altamente redistributiva.

• Não condena regimes como Cuba ou Venezuela; os defende como “modelos democráticos alternativos” (AP News, 2025; Reuters, 2025b).

Diferente de líderes de esquerda moderada, Jara tenta ocultar seu programa ideológico, e sua visão de “superar o modelo neoliberal” com mudanças estruturais. Se alcançar a presidência, com maioria legislativa, não governará como social-democrata nem como de centro, mas como uma comunista comprometida em transformar o Chile em um modelo regional de esquerda radical.

2. O colapso do centro político e a rendição da democracia cristã

Uma das dinâmicas mais preocupantes é o apoio do Partido Democrata Cristão (PDC) à candidatura de Jara. Esta aliança representa uma quebra ideológica sem precedentes. O PDC, historicamente defensor da democracia cristã e da oposição ao comunismo, decidiu apoiar uma candidata que, segundo seus críticos, não é nem democrática nem cristã (Ex-Ante, 2025).

Many ex-militantes have left the party for considering it “complicit in the authoritarian drift of the left.” However, its leaders justify supporting Jara as a pragmatic strategy: ensuring parliamentary representation under a unified list. This political survival logic has led the center to ideologically dissolve, abandoning its moderating role and surrendering to the dominant leftist axis, caring little for principles, but rather their share of popular representation positions.

3. A direita dividida: Uma tragédia anunciada

As duas facções mais importantes da direita enfrentam as eleições divididas entre:

Chile Vamos, que apoia Evelyn Matthei, com o apoio de Renovación Nacional, Evópoli e UDI.

O Partido Republicano, liderado por José Antonio Kast, com o apoio do Partido Social Cristão.

• Há também outros grupos menores, como libertários e dissidentes.

Essa divisão debilitou suas possibilidades tanto na eleição presidencial quanto na parlamentar. De acordo com as pesquisas de julho de 2025:

• Kast lidera com 30–31 %.

• Jara o segue com 27–29 %.

• Matthei mal atinge 14–17 % (Capital Economics, 2025).

4. O Sistema D’Hondt e a batalha pelo congresso

O sistema eleitoral chileno se baseia no método proporcional D’Hondt, que favorece blocos unificados. Isso significa que, embora a direita dividida receba mais votos no total, a esquerda pode obter mais cadeiras se for em uma única lista.

O que isso significa na prática?

A maioria absoluta na Câmara de Deputados são 78 cadeiras.

• Uma maioria de 4/7 (89 deputados) permite modificar leis orgânicas e reformas constitucionais sem plebiscito.

• Segundo projeções recentes, se a oposição for unida, pode conseguir até 87 deputados; se for dividida, mal obterá 68 (Varela, 2025).

No Senado, onde se renovam 23 dos 50 assentos, uma lista única da direita poderia alcançar 27 assentos, uma maioria histórica que lhe permitiria controlar comissões-chave. Mas, divididos, é provável que obtenham apenas 13 (Varela, 2025).

5. Vozes cidadãs clamam por unidade: O chamado de Varela e a Carta Aberta

Duas intervenções recentes publicadas na imprensa chilena destacam a gravidade do momento:

a) Gerardo Varela, ex-ministro e analista político, escreveu:

“Unidos em uma lista se ganha, desunidos em duas se perde.”

“Em um sistema proporcional, é melhor que uma lista arrase do que haver duas parcerias […] A esquerda sabe disso perfeitamente. A direita parece determinada a repetir os erros do passado” (Varela, 2025).

b) Uma Carta Aberta assinada por mais de 100 líderes da sociedade civil instou Kast, Matthei e Kaiser a adiar interesses pessoais e formar uma lista parlamentar única:

“O Chile precisa de mudança. Se agirmos unidos, temos a oportunidade histórica de ganhar a presidência e o congresso. Se formos desunidos, corremos o risco de perder ambos” (Carta Aberta, 2025).

Essas vozes refletem não apenas a urgência política, mas também o apoio cidadã transversal ao chamado à unidade, desvinculado de hegemonias partidárias.

6. O fator China: Aliado silencioso de uma possível vitória comunista

A China, através de uma longa e paciente aproximação, fortaleceu seus laços com o Chile em setores estratégicos como lítio, cobre e telecomunicações. Uma presidência de Jara, favorável a modelos de governança estatal e soberania econômica, beneficiaria enormemente os interesses geoestratégicos de Pequim:

  • Preferência em licitações energéticas e de infraestrutura.

  • Expansão da Huawei e redes 5G.

  • Pescas por grandes frotas pesqueiras chinesas e seu trânsito pelo Estreito de Magalhães, facilitando o acesso ao continente antártico.

  • Alineamento diplomático anti-EE.UU. em fóruns regionais (Xinhua, 2025).

7. Recomendações estratégicas

Para a oposição:

• Formar o mais breve possível e antes do dia 18 de agosto, data em que devem ser inscritas as candidaturas, uma lista parlamentar unificada, excluindo egos e ambições pessoais.

• Pactar uma estratégia comum para a segunda volta presidencial, antecipando uma confrontação direta com Jara.

Para a sociedade civil:

• Apoiar publicamente a unidade.

• Mobilizar o voto informado contra opções ideológicas autoritárias.

Para aliados internacionais:

Monitorar atentamente os resultados e possíveis reformas constitucionais.

• Oferecer alternativas econômicas que compitam com o financiamento chinês.

Como referência, em 21 de julho, ocorreu em Santiago a reunião de Alto Nível denominada Democracia Sempre, com a participação de presidentes de esquerda: Luis Inácio Lula da Silva, do Brasil, Pedro Sánchez, Presidente do Governo da Espanha, Yamandu Orsi do Uruguai, Gustavo Petro da Colômbia, e o anfitrião Gabriel Boric do Chile. Uma mostra viva da esquerda internacional nos resultados das eleições no Chile.

Conclusão

A próxima eleição de 2025 no Chile representa um verdadeiro ponto de inflexão. O risco de uma presidência comunista com maioria legislativa é real, iminente e profundo. A desunião da direita e a desaparecimento do centro criaram o cenário perfeito para uma transformação estrutural do Estado chileno. Apenas uma estratégia de unidade eleitoral pode evitar uma deriva autoritária. Como já alertou a carta cidadã: “O Chile precisa, o eleitorado demanda e a realidade aconselha.”

Uma vitória comunista no Chile não seria apenas uma mudança de governo nacional: seria uma vitória do comunismo no hemisfério ocidental. Dado o prestígio internacional do Chile como país institucionalmente estável, democrático e economicamente sólido, sua transformação ideológica sob uma liderança comunista teria um efeito legitimador e multiplicador para os regimes autoritários da região. Um Chile alinhado com o Foro de São Paulo e simpatizante de Havana, Caracas e Manágua tornaria-se um aliado estratégico altamente eficaz da República Popular da China, facilitando sua penetração tecnológica, comercial e diplomática na América do Sul. Essa nova relação teria como consequência direta um profundo deterioração da influência dos Estados Unidos, ao perder um parceiro chave e tradicional na região andina e no Pacífico Sul. Nesse contexto, uma derrota eleitoral da oposição não seria simplesmente um revés político, mas uma derrota geoestratégica de alto impacto para todo o hemisfério.


Referências

Associated Press. (2025, 30 de junho). Chilean communist scores surprise win in primary vote as battle with far-right looms. https://apnews.com/article/chile-election-farright-communist-jeannette-jara-64aa1a305842384f8e9c31cc61c0ca93

Capital Economics. (2025, 4 de julho). Chile’s communist candidate, Mexico’s weak economy. Latin America Economics Weekly. https://www.capitaleconomics.com/publications/latin-america-economics-weekly/chiles-communist-candidate-mexicos-weak-economy

Ex-Ante. (2025, 26 de julho). DC decide apoyar a Jeannette Jara en las elecciones presidenciales y Undurraga deja la presidencia del partido. https://www.ex-ante.cl/dc-decide-apoyar-a-jeannette-jara-en-las-elecciones-presidenciales-y-undurraga-renuncia-a-la-presidencia/

Reuters. (2025a, 30 de junho). Chile picks Jeannette Jara to face off against right-wing presidential field. https://www.reuters.com/world/americas/chile-picks-jeannette-jara-face-off-against-right-wing-presidential-field-2025-06-29/

Reuters. (2025b, 22 de julho). Jeannette Jara is a coalition Communist who wants to be Chile’s next president. https://www.reuters.com/world/americas/jeannette-jara-is-coalition-communist-who-wants-be-chiles-next-president-2025-07-22/

The Guardian. (2025, 30 de junho). Chile communist Jeannette Jara to lead beleaguered ruling coalition at election. ""https://www.theguardian.com/world/2025/jun/30/chile-jeannette-jara-communist-candidate

The Times em Português. (2025, 20 de julho). Carta Aberta a José Antonio Kast, Evelyn Matthei, Johannes Kaiser e os líderes da oposição ao governo. https://thetimes.cl/contenido/6543/carta-de-empresarios-a-kast-matthei-y-kaiser

Varela, G. (2025, julho). Unidos em uma lista se ganha, desunidos em duas se perde. Publicado na mídia chilena. https://fppchile.org/unidos-en-una-lista-se-gana-desunidos-en-dos-se-pierde/

Xinhua News. (2025, 30 de junho). Resumo: Ex-Ministra Jeannette Jara vence as primárias presidenciais oficiais do Chile. https://spanish.news.cn/20250630/b3cacbe5d83f4dbd80692b2085cfaf9a/c.html

José Adán Gutiérrez supervisiona as operações e a estratégia na América Latina, com mais de 40 anos de experiência nos setores militar, civil e privado. Domina o espanhol e possui ampla experiência em inteligência, segurança e diplomacia em todo o continente americano, incluindo mais de duas décadas como Oficial de Inteligência Naval e Agregado Naval dos EUA no Panamá. Anteriormente, ocupou altos cargos na SAIC, Mission Essential e INDETEC, e possui títulos avançados da Escola de Guerra Naval e da Universidade de Nova York.

Claudio Niada. Sócio comercial na Ecoloop SpA (Chile)

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