Entre os muitos fatores que permitiram a vitória da La Libertad Avanza nas eleições do ano passado, um que pode ser considerado chave, e que mesmo hoje em dia ainda lhe dá uma margem de ação mais ampla do que a governos anteriores, é a fraca oposição. A qual se mostra incapaz de se organizar e oferecer um verdadeiro debate sobre as políticas impulsionadas pelo governo atual.
No entanto, é uma questão de tempo até que essa situação mude, e a maneira como se formar uma bancada oposicionista ao governo, seja direta ou indiretamente, definirá como se desenvolverá o panorama político nos próximos anos.
Oficialismo e Oposição: Quem define quem?
A relação oficialismo-oposição é de equilíbrio, já que responde a uma sociedade que, por sua vez, demanda líderes que reflitam seus interesses. Um exemplo disso pode ser Milei, que representa de muitas maneiras os interesses e preocupações das novas gerações e uma insatisfação com a política tradicional. Ou Macri, que encarnou, em seu momento, o cansaço da sociedade frente a tantos anos de governo kirchnerista. Os opositores aos diferentes governos se organizam sob uma liderança, reagindo, mas também condicionando suas contrapartes a tomar decisões que, em outro contexto, não teriam tomado. Um bom exemplo disso foi a criação do Frente de Todos em 2019, com sua fórmula Fernández-Kirchner, que forçou o então presidente, Mauricio Macri, a criar sua própria coalizão, Juntos por el Cambio, em uma tentativa de captar uma maior porcentagem do eleitorado que seu competidor direto. Esse é apenas um caso em que fica muito evidente esse fenômeno, mas não é demais esclarecer que esse constante condicionamento mútuo pode ocorrer em ocasiões muito menores, em escalas mais difíceis de identificar.
No entanto, a intenção deste artigo não é sobrecarregá-los com todos os casos possíveis em que uma oposição determina as ações do oficialismo ou vice-versa, mas deixar claro que existe essa relação entre ambos e que não é um determinante menor.
Renovação? Ou os mesmos de sempre?
O contexto de incerteza que mencionamos no início, somado a uma evidente mudança geracional, apenas amplia o leque de cenários que podem ocorrer nos próximos anos, sendo um momento de oportunidades para que novas caras se façam ver, depois de tantos anos em que pareciam estar os mesmos jogadores de sempre. Seja um retorno de Cristina Kirchner como cabeça do movimento “anti-Milei”, um membro do PRO insatisfeito com o alinhamento de seu partido, ou alguém completamente novo, o certo é que estamos à porta de uma grande mudança no panorama político; eu me atreveria a dizer que a maior desde o retorno à democracia. Embora nunca seja prudente dar por mortos aqueles que têm mais experiência, já que são eles que melhor sabem como se manter no jogo. Mesmo assim, são inegáveis todos os conflitos tão profundos que parecem invadir os partidos opositores, que não são mais do que um sintoma de que as águas da política estão agitadas.
Qual é a postura do oficialismo?
Mas claramente, ao presidente e seu partido não é muito conveniente que a oposição se adapte ao novo panorama. Na verdade, o ideal para o oficialismo, de cara a futuras eleições, é que tudo permaneça como está. No entanto, esse cenário é demasiado improvável; a instabilidade se caracteriza exatamente por isso: por ser incapaz de permanecer por muito tempo no mesmo estado. E a estratégia da La Libertad Avanza pareceria estar em Cristina Kirchner. Agora mesmo, o presidente e a ex-presidente parecem estar jogando um jogo que beneficia ambos. Tudo indica que Milei busca focalizar as vozes críticas na figura da ex-mandatária; o que, por sua vez, é aproveitado por ela mesma. A estratégia é fazer com que seus opositores se organizem de forma que a maioria dos eleitores continue ao seu lado da divisão, e pelo que parece, o partido libertário considera que esse cenário é o que, agora, a presidente do PJ ocupa do outro lado. Somente o tempo dirá se efetivamente esse era o melhor caminho para o governo atual.
Muita incerteza, muitas oportunidades
Em conclusão, quando o filme não tem roteiro, qualquer ator pode levar o papel principal, e há muitos anos não tínhamos um panorama tão incerto sobre os atores de cara a futuras eleições na Argentina. Está se dando o contexto perfeito para que figuras, partidos e espaços, desde marginais até inexistentes, tomem relevância e se posicionem como as caras da política na próxima década. Este poderia ser o tempo em que vejamos surgir os futuros líderes, tanto da oposição quanto do oficialismo. Toda instabilidade é, ao mesmo tempo, um problema e uma oportunidade.
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