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Rede Sob Fogo: o Exército e a Máfia Pachenca na Fronteira Colombiana

Por Poder & Dinero

Rede Sob Fogo: o Exército e a Máfia Pachenca na Fronteira Colombiana

William Acosta, CEO da Equalizer Investigations para FinGurú

Introdução

O sol arde sobre os caminhos de areia no Caribe colombiano, onde as crianças brincam entre a brisa e os adultos vigiam o horizonte com uma mistura de resignação e temor. Nesta terra que algum dia acreditou na promessa do uniforme, a desilusão penetra mais fundo do que o calor: soldados, uma vez vistos como guardiões, hoje aparecem em rumores e manchetes, apontados como cúmplices daqueles que tingem de violência os vales e a serra. Cada família se lembra da última vez que as balas romperam a tranquilidade da noite, perguntando-se se aquela munição não vinha, talvez, do mesmo arsenal que deveria protegê-los.

Não é fácil para as comunidades distinguir onde termina a instituição e onde começa o crime, quando a linha se apaga entre o quartel e a zona de guerra. No fundo, cada notícia sobre armas roubadas, sobre rotas clandestinas, sobre pactos e traições, é também a história de comunidades cansadas e de um país que se entristece, ainda esperando que a justiça retorne ao seu lado. Porque este caso não é apenas um escândalo: é a ferida aberta da Colômbia, em carne viva, pedindo respostas firmes e humanas.

Rede sob fogo: o Exército e a máfia Pachenca na fronteira colombiana

Pelas ruas empoeiradas de Valledupar, na alta Guajira e na imponente Sierra Nevada, o rumor se tornou certeza. Nos quartéis da região, onde cada cartucho deveria defender a pátria, a munição terminava fora de lugar; nas mãos de quem vê o Estado como um inimigo a ser derrotado. O caso da rede de militares infiltrada pelos Pachenca não é apenas uma nota para o arquivo judicial: é o drama real de uma guerra interna silenciosa, onde os protagonistas têm nome, história e até família que sofre as consequências.

O coração da traição: Soldado Rendón, de herói a engrenagem criminosa

Na lista dos capturados, destaca-se o soldado Rendón. Quinze anos de trajetória, especialista em munições, expert em manuseio de explosivos. Um veterano, como o apelidam nos corredores militares, que passou de custodiar arsenais a abrir a porta aos melhores preços. Dissidências das FARC, o ELN, os Pachenca: todos tiveram acesso ao arsenal militar colombiano, cartuchos calibre 5.56 a 10.000 pesos a unidade e granadas de fragmentação que mudaram de lado em tempo recorde (Semana, 2025; Infobae, 2025).

A operação era tão sofisticada quanto rotineira

os pagamentos eram confirmados com vídeos onde notas e munições estavam presentes.

Alias “o Veterano” fazia o contato, “Pinocho” autorizava o envio e a rede de ajudantes—ainda sob investigação—facilitava a extração. Cada entrega representava minutos de tensão, negócios fechados entre as sombras do barracão militar e o barulho da fronteira.

Origem e poder criminal dos Pachenca

Os Pachenca, também conhecidos como Autodefensas Conquistadores da Sierra Nevada (ACSN), surgiram de antigos blocos paramilitares e ganharam força em Magdalena, La Guajira e Santa Marta. Controlam rotas de narcotráfico, extorsão e zonas de disputa armada contra organizações rivais como o Clã do Golfo. Hoje, sua presença se estende por 97 comunidades, exercendo controle social e gerando um clima constante de violência e terror (Sur.org.co, 2020; Colombia Reports, 2023; Infobae, 2025).

O coração da traição:

O Soldado Rendón, de herói a engrenagem criminosa

Destacado por quinze anos de serviço e experiência em explosivos, o soldado Rendón organizou o desvio de munições —cartuchos 5.56 a 10.000 pesos cada um e granadas de fragmentação— de depósitos oficiais para grupos armados como as dissidências das FARC, o ELN e os Pachenca (Semana, 2025; Infobae, 2025). Os pagamentos eram confirmados com vídeos de “fe de vida”, mostrando maços de notas e carregamentos. Alias “o Veterano” coordenava as vendas, enquanto “Pinocho” liderava a estrutura criminosa e os colaboradores facilitavam extrações, uso de rotas e encobrimentos. O fluxo ilegal era tão sistemático quanto qualquer operação logística oficial.

Um mapa do crime: rotas internacionais e logística clandestina

As armas e munições roubadas seguiam rotas desde a Florida (EUA), atravessando Costa Rica, República Dominicana e Venezuela antes de chegar a Maicao, Nazareth e Uribia na Colômbia. O arsenal era acumulado e distribuído por lanchas e veículos disfarçados —incluindo suspeitas sobre o uso de caminhões militares— em regiões onde a linha entre Estado e crime é apenas perceptível (Infobae, 2025; Periódico UNAL, 2025; Semana, 2025).

O processo de modernização militar venezuelano permitiu o desvio de fuzis FAL e AK-47, revendidos por oficiais corruptos a máfias colombianas, fortalecendo o armamento dos Pachenca com rifles R-15, Bushmaster, Barrett e pistolas Five-Seven, conhecidas entre os próprios militares como “matapolicías” (Infobae, 2025). Em abril de 2025, uma operação em grande escala lhes entregou dez fuzis Barrett em troca de meia tonelada de cocaína, usando os mesmos barcos que transportam drogas para a República Dominicana (Infobae, 2025; Semana, 2025).

Números oficiais sobre munição desviada

A extensão da corrupção interna se evidenciou com a auditoria do Exército e da Promotoria: em 2024 e 2025, foram denunciados o desaparecimento de mais de um milhão de munições, embora o número auditado tenha sido revisado para 131.000 projéteis e 5.850 granadas, a maioria conectadas a redes ilícitas do Caribe e da fronteira. As autoridades implementaram controles eletrônicos e auditorias rigorosas, mas grande parte do material terminou nas mãos do ELN, dos Pachenca e outras organizações armadas, alimentando a violência regional (El Financiero, 2024; Voz de América, 2024; Infobae, 2025).

Mais além dos fuzis: O que está em jogo para a sociedade?

Não apenas rotas e arsenais mudaram: a sogra do soldado Rendón movimentou 400 milhões de pesos em apenas quatro meses, e ele mesmo acumulou cerca de 2.000 milhões, segundo a Promotoria. O dinheiro sujo circulou por hotéis, empresas de transporte e bilhares. As balas roubadas terminaram em crimes e atentados, cobrando vidas de soldados e civis. O medo e a desconfiança marcam hoje o dia a dia em vilarejos e cidades da região.

O Estado responde: prisões, audiências e depuração necessária

Em resposta, a Dijín, a Promotoria e a Inteligência Militar capturaram 23 pessoas-chave: desde chefes logísticos até responsáveis pela manutenção e acúmulo de armamento. Rendón, o Veterano e seis elos logísticos enfrentam acusações de conluio para delinquir, tráfico de armas e lavagem de ativos. Os processos penais permanecem ativos e sob vigilância constante, refletindo a magnitude do desafio para limpar e proteger as instituições militares (Semana, 2025; Infobae, 2025; La Guajira Hoy, 2025).

Conclusão:

Uma ferida social e um desafio coletivo

O que aconteceu nas fileiras do Exército colombiano e sua convivência com máfias como os Pachenca deixou uma ferida profunda na confiança pública, no tecido social e na própria identidade nacional. As balas desviadas não apenas armam mãos criminosas, mas quebram a esperança daqueles que ainda acreditam que o uniforme representa proteção e justiça. O drama cotidiano dos povos afetados se traduz em medo permanente, deslocamentos forçados, vítimas invisíveis e uma juventude que considera a violência como a única saída viável ou, pior ainda, como um negócio rentável (Plano Colômbia 2.0, 2025; Diálogo Político, 2025).

Cada número de munição roubada resume anos de negligência e corrupção, mas também a urgência de um Estado vigilante e transparente. A estigmatização e a dor arrastam famílias inteiras de militares e civis igualmente, semeando ressentimento e desconfiança. As lideranças comunitárias pagaram com sangue e ameaças a denúncia desses fatos e a Colômbia carrega hoje a responsabilidade ética e política de romper esse ciclo.

A reação do Estado, eficaz em prisões e judicialização— deve ser acompanhada de prevenção, melhorias logísticas, tecnologia para acompanhamento de arsenais e uma cultura institucional baseada em ética e serviço. A reconstrução da confiança institucional será longa, mas indispensável para devolver a paz e a esperança às regiões mais atingidas.

O desafio coletivo é transformar a indignação em reformas, onde a transparência e a proteção real das comunidades prevaleçam sobre qualquer interesse criminoso. Somente assim a Colômbia poderá finalmente romper o ciclo vicioso da violência e começar a curar a ferida que deixa este caso em suas fileiras mais íntimas (Ideias para a Paz, 2025; Indumil, 2025).

Sobre o Autor: William L. Acosta é graduado da PWU e da Universidade de Alliance. É um oficial da polícia aposentado da polícia de Nova York, assim como fundador e CEO da Equalizer Private Investigations & Security Services Inc., uma agência licenciada em Nova York e na Flórida, com projeção internacional.

Desde 1999, liderou investigações em casos de narcóticos, homicídios e pessoas desaparecidas, além de participar da defesa penal tanto em nível estadual quanto federal.

Especialista em casos internacionais e multijurisdicionais, coordenou operações na América do Norte, Europa e América Latina.

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