William Acosta, CEO da Equalizer Investigations para FinGurú
INTRODUÇÃO: PRIVILÉGIO E REDES TRANSNACIONAIS
Viver no Paraguai ou na Argentina em 2025 significa não apenas enfrentar as dificuldades cotidianas do cidadão comum, mas descobrir como o poder e o dinheiro constroem rotas discretas onde os privilégios cruzam fronteiras. Os nomes de funcionários, empresários e operadores aparecem em cada capítulo dessa trama: carros de luxo, matrículas de aviões particulares, transferências bancárias multimilionárias, contratos ajustados ao milímetro e favores que parecem impossíveis para aqueles que não estão no topo do poder. É um relato onde o Estado se torna palco de negociações privadas e onde a indignação social cresce a cada nova revelação. Testemunhas-chave como Luz Candado no Paraguai relatam como envelopes de dinheiro circulam em palácios presidenciais (ABC Color, 2025a). A reação oficial, em ambos os países, oscila entre o silêncio e a ocultação, levando o leitor a se perguntar quem ganha e quem perde quando o público se privatiza pela força da influência, da estratégia e do acesso privilegiado.
TRAMA PARAGUAIA: O ENGANAGEM DA OSTENTAÇÃO
No centro da história está uma Toyota Land Cruiser cinza, placa WCEO 645, transferida em 2023 de Decorapar SA, presidida pelo empresário chinês Long Jiang, para Real Viviendas EAS, propriedade de Santiago Peña (presidente) e Francisco Peña (empresário e irmão) (RDN, 2025). Este veículo, além de seu preço e luxo, conecta viagens presidenciais e transferências oficiais com a logística aérea fornecida pela Hoahi SA; aviões particulares identificados (matrículas ZP-GOD, ZP-BDT, H958JL), pilotados e organizados a partir dos círculos de Jiang, acompanham as viagens de Peña e executivos essenciais como Pedro Alliana (vice-presidente) (Flightradar24, 2025).
Kamamya SA, outra empresa sob controle de Jiang, obteve em 2023 a licitação para fornecer 328,687 carteiras escolares à Itaipú Binacional: um total de quase USD 32 milhões, pagando preços acima do normal por móveis importados da Shanghai Sinotex United Corp. Ltd. (Moopio, 2025). Bancos como BBVA Paraguai, Banco Continental e Banco Regional gerenciaram os pagamentos e transferências documentados. O caso penal paraguaio está sendo investigado sob o expediente unificado intitulado “Causa Carteiras Chinesas”, Procuradoria Anticorrupção Paraguai, número do expediente: MEC 2025-25038 (ABC Color, 2025b; Ministério Público, 2018). Os documentos de importação mencionam despacho de importação número 8IC04001304 referente a uma das operações realizadas pela Kamamya SA (Moopio, 2025).
A essa infraestrutura se somam denúncias diretas como as feitas por Luz Candado, ex-funcionária presidencial, que devolveu envelopes com USD 200,000 e foi posteriormente excluída do círculo (ABC Color, 2025a). A investigação continua no expediente fiscal: MEC 2025-25038, Causa Carteiras Chinesas.
A penetração chinesa no Paraguai transcende a trama das carteiras e dos carros. Empresas como Decorapar SA, Kamamya SA e Hoahi SA, lideradas por Long Jiang, capitalizaram a abertura paraguaia a produtos e logística asiática, deslocando marcas locais e entrando nas esferas mais estratégicas do comércio, da construção e da influência (Infobae, 2025; Resumo Latinoamericano, 2025).
TRAMA ARGENTINA: TRANSFERÊNCIAS, LOGÍSTICA E OCULTAÇÃO NA CÚPULA POLÍTICA
Em Buenos Aires, o empresário Antonio “Fred” Machado (detido por lavagem de dinheiro e vinculado ao narcotráfico internacional) financiou a campanha do deputado José Luis Espert com uma transferência de USD 200,000 (Página12, 2025; ElDiarioAR, 2025). A ponte legal foi Francisco Oneto, advogado de Machado e operador do presidente Milei. Debora Lynn Mercer-Erwin, sócia e condenada no Texas, estruturou fideicomissos dos quais partiu essa transferência, registrada na contabilidade do caso federal “United States v. Debra Lynn Mercer-Erwin et al.”, Eastern District of Texas, indictment 4:20-CR-212, Doc. 224 (US District Court, Texas, 2021).
O modelo logístico de carros e jatos particulares, e os contratos com consultorias (caso Libra/Hermes), aparecem em investigações abertas na jurisdição federal argentina por financiamento ilícito de campanhas e lavagem de dinheiro (Fiscalía Federal San Isidro, BBC Mundo, 2025).
A controversa causa dos áudios de Karina Milei e os contratos de compras estatais com supostos sobrepreços e propinas estão sendo tramitados em tribunais federais como “Causa por supostas propinas na ANDIS” (El País, 2025; M24, 2023). Esses áudios e o escândalo da Drogueria Suizo Argentina colocaram o foco sobre a Secretaria Geral da Presidência e o círculo íntimo de Milei pouco antes das eleições, afetando sua imagem pública e suas possibilidades eleitorais (CNN Español, 2025; Reuters, 2025).
IMPACTO DESTRUTIVO: DESCONFIANÇA, INVESTIMENTO E ELEIÇÕES
Esses escândalos afetam gravemente a imagem da administração de Javier Milei e geram consequências imediatas e profundas (BBC Mundo, 2025; Reuters, 2025; Pagina12, 2025). A percepção de impunidade e cumplicidade, junto com os áudios e os processos judiciais prolongados, erodem o capital político e a confiança social. A incerteza impacta o investimento estrangeiro, aumenta o risco país e reduz as expectativas de crescimento (LATimes, 2025; Management & Fit, 2025). Mais de 73% dos argentinos consideram “muito grave” a corrupção, e mais de 60% responsabilizam a atual gestão e diretamente o entorno de Karina Milei (Escambray, 2025).
O fracasso das instituições em concluir de modo efetivo e transparente os processos judiciais habilita a frustração e o voto de castigo, selando a desconfiança generalizada e enfraquecendo as democracias da região (DW, 2025; Última Hora, 2025; Quántico, 2025).
CONCLUSÃO: O FUTURO EM JOGO ENTRE A INDIGNAÇÃO E A RENOVAÇÃO DEMOCRÁTICA
O emaranhado de corrupção que envolve funcionários, empresários internacionais e redes políticas não é apenas um problema legal ou administrativo: é, acima de tudo, uma ferida social e cultural. Tanto no Paraguai quanto na Argentina, a sensação de que os privilégios, a arbitrariedade e a impunidade são a regra, destrói a fé social no pacto democrático (Paraguai, Última Hora, 2025; Argentina, BBC Mundo, 2025). O escândalo não atinge apenas os governos atuais, mas também enfraquece a imagem internacional de ambos os países e perturba a confiança de investidores e organismos multilaterais.
A falta de respostas exemplares e a tentação permanente da ocultação alimentam o descontentamento popular, propiciando protestos, perda de credibilidade eleitoral e uma erosão da legitimidade institucional (Escambray, 2025; LATimes, 2025). Se os órgãos de controle e investigação — juízes, promotores e corpos policiais — não romperem a inércia da procrastinação e do amparo corporativo, a sociedade voltará a ver a democracia como uma promessa falida, abrindo-se a saídas autoritárias ou ao retraimento à abstenção.
No entanto, a indignação, quando é articulada com memória e com uma exigência ativa de transparência, pode ser a semente da mudança. O registro meticuloso de expedientes, transferências, matrículas e atores implicados deixa testemunho não apenas do dano, mas também das ferramentas possíveis para o controle cidadão. Que a Justiça, em sua dimensão mais imparcial, profunda e restauradora, aplique o peso da lei aonde tiver que fazê-lo, sem olhar nomes ou sobrenomes, é a única saída para recompor a fé pública e restaurar o sentido da vida institucional na região (DW, 2025; Embaixada dos EUA, 2025).
O destino do Paraguai e da Argentina depende agora de sua capacidade coletiva para não ceder ao desencanto, mas forjar sociedades mais atentas, menos frágeis e realmente intolerantes à corrupção como sistema.
Sobre o Autor:
William L. Acosta é graduado pela PWU e pela Universidade de Alliance. É um oficial de polícia aposentado da polícia de Nova York, além de fundador e CEO da Equalizer Private Investigations & Security Services Inc., uma agência com licença em Nova York e Flórida, com projeção internacional.
Desde 1999, tem liderado investigações em casos de narcóticos, homicídios e pessoas desaparecidas, além de participar da defesa penal tanto a nível estadual quanto federal.
Especialista em casos internacionais e multijurisdicionais, coordenou operações na América do Norte, Europa e América Latina.
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