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O inimigo em casa

Por Poder & Dinero

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Rahmanullah Lakanwal é um homem afegão, originário da província de Khost, que durante vários anos integrou unidades especiais de segurança ligadas à antiga República do Afeganistão. Ele fez parte de duas unidades apoiadas diretamente pela CIA, embora na estrutura formal aparecessem sob a Direção Nacional de Segurança (National Directorate of Security, NDS). Dentro desse esquema, seu destino principal foi a Unidade 01 (NDS‑01), um componente militar‑de inteligência com jurisdição sobre a região central do país, que incluía as províncias de Cabul, Parwan, Wardak e Logar.

Formação e treinamento especializado

O processo de treinamento de Lakanwal com a agência remonta a 2007. Nesse ano, ele foi enviado para a Eagle Base (também conhecida como Eagle Camp), um complexo da CIA situado nas proximidades do distrito de Deh Sabz, província de Cabul, a poucos quilômetros do Aeroporto Internacional Hamid Karzai. Eagle Camp foi construído sobre o terreno de uma antiga fábrica de tijolos e, com o tempo, se consolidou como um dos centros de treinamento antiterrorista mais importantes da CIA no início dos anos 2000. Nessas instalações, foram treinadas distintas unidades apoiadas pela agência dentro do NDS: NDS‑01, NDS‑02, NDS‑03, NDS‑04, a Khost Protection Force (NDS‑KPF) e a Kandahar/Kabul Special Force (NDS‑KSF). O complexo abrigava ainda um depósito de munições de grande porte e múltiplas infraestruturas reservadas para operações sensíveis. Com a retirada das forças americanas em 2021, Eagle Camp foi um dos últimos pontos a serem evacuados e demolidos, e posteriormente passou ao controle da brigada de suicidas Badri 313, vinculada à rede Haqqani.

Asignação operativa e experiência em combate

Após completar sua capacitação na Eagle Base, Lakanwal foi transferido para a equipe de apoio à base da CIA em Kandahar. Essa instalação funcionava como quartel-general da Kandahar Strike Force, uma força de choque utilizada para operações de contra-insurgência e contraterrorismo apoiadas pela CIA. A partir de lá, eram coordenadas missões nas províncias de Kandahar, Uruzgan e Zabul contra o Talibã, al‑Qaeda e, mais adiante, células do ISIS. Nesse contexto, Lakanwal participou de operações de contraterrorismo implantadas em Kandahar, onde atuou junto a forças americanas em território.

Vínculos familiares com ISKP e reação do ISIS ao ataque em DC

Após o ataque contra efetivos da Guarda Nacional em Washington, DC, canais propagandísticos associados ao ISIS foram os primeiros a elogiar publicamente a ação. Um dos fatores-chave foi o histórico de radicalização no ambiente familiar de Lakanwal. Seu meio-irmão (filho da segunda esposa de seu pai) tinha sido recrutador do Estado Islâmico da Província de Jorasán (ISKP). Esse meio-irmão era conhecido sob o nome de Muawiyah Khurasani e também como Hayatullah. Antes de se incorporar formalmente ao ISKP, ele havia trabalhado com o Tehrik‑e‑Taliban Pakistan (TTP) na Agência de Orakzai, Paquistão. Posteriormente, foi abatido em uma operação dirigida em julho de 2022 no distrito de Achin, província de Nangarhar. Dentro de alguns círculos do ISIS, sustenta-se que sua morte teria sido consequência de uma ação do Departamento de Luta contra o Terrorismo (Counter Terrorism Department, CTD) do Paquistão, o que não foi confirmado de forma independente.

Situación após a queda de Cabul e exposição a ameaças

Com a queda de Cabul em agosto de 2021, as unidades em que Lakanwal havia servido — em particular a Kandahar Protection Force e a Khost Protection Force (KPF) — se tornaram alvos de alto valor para a rede Haqqani e para o ISKP. Ambas as organizações identificaram os ex-integrantes da KPF como alvos prioritários, com o propósito de:

• Exercer pressão ou chantagem sobre antigos membros.

• Recrutá-los aproveitando sua experiência operacional e seu conhecimento de procedimentos e pessoal ocidental.

O interesse aumentou devido aos vínculos estreitos que muitos desses ex-combatentes mantinham com pessoal americano, especialmente com antigos oficiais da CIA estabelecidos em território dos Estados Unidos. Essa relação aumentava seu valor potencial como fontes de informação, intermediários ou ativos recrutáveis.

Falsificação de identidades e uso de credenciais de unidades especiais

De forma paralela, a rede Haqqani, ISKP e al‑Qaeda detectaram o potencial operacional de se passarem por integrantes das unidades especiais afegãs apoiadas pela CIA. Nesse cenário, ocorreu um volume significativo de documentação fraudulenta: estima-se que pelo menos alguns milhares de documentos e identificações falsas foram gerados, permitindo a militantes e simpatizantes se apresentarem como membros da KPF, das unidades 01 e 02 e de outros grupos especiais do NDS. O objetivo principal dessa falsificação era explorar os canais de evacuação e reassentamento para os Estados Unidos, alegando um suposto serviço prévio ao lado de forças aliadas para obter prioridade no processo.

Essa manobra facilitou que determinados indivíduos se infiltrassem nos mecanismos de evacuação e reubicacao, utilizando afiliações inventadas a essas unidades especiais como cobertura. No caso específico de Rahmanullah Lakanwal, no entanto, os antecedentes disponíveis indicam que tanto sua identificação quanto seu histórico de serviço eram autênticos e correspondem efetivamente à sua trajetória na Unidade 01 e em estruturas associadas à Kandahar Protection Force.

William Acosta é o fundador e diretor executivo da Equalizer Private Investigations & Security Services Inc. Ele coordenou investigações relacionadas ao tráfico internacional de drogas, lavagem de ativos e homicídios nos EUA e em outros países do mundo, como Alemanha, Itália, Portugal, Espanha, França, Inglaterra e, literalmente, toda a América Latina.

William foi 10 anos Investigador da Polícia de Nova York, 2 anos no Departamento do Tesouro e 6 anos no Exército americano com vários desdobramentos internacionais por temas de comunicações e inteligência.

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Sergio Berensztein, Fabián Calle, Pedro von Eyken, José Daniel Salinardi, William Acosta, junto a um destacado grupo de jornalistas e analistas da América Latina, Estados Unidos e Europa.

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