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O Império Invisível de Marset: Como o Novo Narco Global Redefiniu o Crime Transnacional

Por Poder & Dinero

O Império Invisível de Marset: Como o Novo Narco Global Redefiniu o Crime Transnacional

William Acosta, CEO da Equalizer Investigations para FinGurú

Introdução

A história de Sebastián Enrique Marset Cabrera exemplifica a metamorfose do crime organizado latino-americano em uma rede global, adaptável e protegida. Surgido das margens do narcotráfico em Uruguai e do presídio de Libertad, Marset ascendeu até articular rotas internacionais, utilizar identidades múltiplas, fundar empresas de fachada e receber proteção estatal e diplomática. Sua influência se estende ao Paraguai, Bolívia, Colômbia, Brasil, Espanha, Dubai e o continente europeu, assim como ao corredor Venezuela-Caribe. A magnitude de suas operações, seu vínculo com homicídios de alto perfil e seu papel central na Nova Junta do Narcotráfico exigem uma reflexão urgente sobre os mecanismos de impunidade e cumplicidade transnacionais que desafiam a capacidade de resposta judicial e policial no século XXI (BBC Mundo, 2023; OCCRP, 2025).

 

Trajetória Criminal e Expansão Internacional

Marset deu seus primeiros passos na criminalidade uruguaia vinculado ao tráfico de drogas e associações ilícitas em Montevidéu, expandindo sua influência desde sua reclusão no presídio de Libertad, onde contatou emissários do Comando Vermelho e do PCC. Após obter liberdade antecipada por boa conduta e a ajuda de contatos internos, empregou uma estratégia criminal sofisticada que, sob empresas fictícias e fachadas legais na América do Sul e na Europa, permitiu o fluxo de toneladas de droga e milhões de dólares através de fronteiras e sistemas bancários globais (La Diaria, 2023; Caras y Caretas, 2025; Debate Uruguai, 2025).

 

Identidades, Documentos e Mecanismos de Evasão

A constante no percurso de Marset é a reinvenção identitária: forjou seu caminho com documentos originais e falsos sob nomes como Sebastián Enrique Marset Cabrera (Uruguai), Gabriel De Souza Beumer (Bolívia), Luis Paulo Amorín Santos (Brasil) e variantes no Paraguai e Dubai. Obteve passaportes exprés (caso Dubai-2021), manipulação biométrica na Bolívia (SEGIP) e combinação de dados legais para mudar, operar empresas e escapar de capturas com a ajuda de diplomatas e advogados próprios (OPINIÓN, 2023; Subrayado, 2023).

 

Empresas, Bancos e Paraísos Fiscais

A estrutura financeira de Marset é um mapa global. No Paraguai, lavou ativos usando o Banco Basa e o Banco Continental com empresas como Total Cars S.A. (RUC 80056453-1, Assunção) e Tapyracuái S.A. No Brasil, interveio no Banco Bradesco e no Banco do Brasil através de empresas falsas como Comércio Engrenagem Ltda. (CNPJ 16.232.561/0001-87), movendo capitais através de Mato Grosso do Sul, sempre protegido por seus vínculos criminais. No Uruguai, os fluxos efetivos transitavam por Itaú, Santander e agências do BROU junto com Gianina García Troche. Na Bolívia, utilizou o BCP, Banco Nacional de Bolívia e Fassil, usando firmas como Inversiones Anaconda S.R.L. (NIT 455216013) e Exportbol S.R.L. (NIT 212334019). Na Colômbia, lavou capitais no Bancolombia e Davivienda através de Mastian Productions SAS (NIT 901186260-4) e JC Productions SAS (NIT 901258311-1). Na Espanha, utilizou CaixaBank, BBVA e Sabadell com Capiatá Sports S.L. (B01663703, Málaga) e Marset Real Investments S.L. (15078243, Alicante). Em Dubai, operou com Emirates NBD, Mashreq Bank, Blue Palm Investments Ltd. (DMCC-79542) e Bala Sport Investment Ltd. (1189776).

A multiplicidade de jurisdições mostra a profissionalização logística e legal que sustenta sua rede (Debate Uruguai, 2025; OCCRP, 2025; El Observador, 2025).

 

Clubes de Futebol e Entretenimento Esportivo

Marset usou o esporte como uma máscara de legalidade e vetor para mover dinheiro ilícito. Jogou e foi dono de Los Leones El Torno F.C. (Bolívia, reg. FBF LOT-2021) e patrocinador informal do Deportivo Capiatá (APF 872/2008) no Paraguai, promovendo a Total Cars como patrocinador e usando vínculos com jogadores como Julio Irrazábal para lavar grandes quantias. No Uruguai, investiu em equipes amadoras associadas à AUF, e na Espanha participou de movimentos na Terceira Divisão através de laranjas (Infobae, 2024; El Comercio, 2023; ANF Bolívia, 2025).

 

Contatos Estratégicos: Comando Vermelho, Trem de Aragua e Conexões com Hezbollah

A estrutura defensiva e operacional de Marset inclui alianças internacionais com máfias regionais e grupos terroristas.

 

Comando Vermelho brasileiro, os nomes-chave são Carlos Henrique dos Santos Silva (“Carlão”), coordenador logístico fronteiriço; João Paulo da Silva Leme (“Paulinho Vermelho”), gestões financeiras e proteção de cargas; Otávio José Gomes Neto (“Tavinho”), chefe armado de rotas estratégicas; e Luiz Alberto “Betito” Suárez, referente em prisões uruguaias e relações com o PCC.

 

Trem de Aragua, Marset mantém laços com Héctor “Niño” Guerrero Flores (chefe fundador), Yhonny Eduardo “Mono” Contreras Velásquez (corredores no Chile e Bolívia), Jesús Alfredo “Niche” Rivas Vásquez (receptor em Cúcuta e conexão colombiana-venezuelana) e Yulber Rodríguez Patiño (“Chino” Patiño), encarregado do tráfico de armas e logística entre a tríplice fronteira e Ciudad del Este (BBC Mundo, 2023; Estrategia La, 2025).

 

As conexões com Hezbollah, consideradas prioritárias pela DEA e Europol, ocorrem através de Ali Ahmad Nassereddine, empresário libanês-brasileiro que triangula fundos de Marset com o Oriente Médio; Moussa Oday El Hajj, arrecadador que canaliza transferências de bancos venezuelanos para contas de fachada em Dubai e Líbano; e Walid Maklad, responsável por “legalizar” exportações e camuflar remessas de capital em circuitos comerciais legais. Este esquema evidencia a escala do crime organizado e sua capacidade de hibridar lógicas narco, financiamento ilícito e negócios legais de alta complexidade (El País, 2023; OCCRP, 2025).

 

Aliados e Equipe mais Próxima

A lista de colaboradores íntimos de Marset, baseada em arquivos e imprensa, é composta por Gianina García Troche (esposa e titular em sociedades em várias jurisdições), Miguel Ángel Insfrán Galeano (“Tío Rico”, líder paraguaio do clã Insfrán), Federico Santoro Vassallo (contador especializado em lavagem, condenado no Uruguai), Jairo Criado Tarazona (ex-militar e sócio logístico na Colômbia), Ovidio Rojas Aquino (investidor e elo logístico da Bolívia), Mauricio Schwartzman Colman (assassinado em 2023, referência em documentos e gestões), Diego Marset Cabrera (irmão e cérebro logístico), Gianina Brítez Martínez (advogada internacional) e outros operadores de segundo nível em cada país.

 

Fugas Carcerárias e Proteção Institucional

Marset escapou em diferentes momentos de sistemas carcerários e operativos de captura mediante corrupção, abuso de lacunas legais e alerta antecipada de seus contatos-chave. No Uruguai, obteve liberdade antecipada sem mediar fuga violenta, graças a reduções de pena, bom comportamento e corrupção administrativa. Em Dubai, aproveitou a entrega expressa de um novo passaporte uruguaio e gestões diplomáticas para evitar a extradição. Na Bolívia, nunca entrou formalmente na prisão: suas fugas foram preparadas com subornos, veículos blindados, uso de identidades falsas e infiltrações diretas de corpos policiais, permitindo-lhe antecipar buscas e escapar horas antes de qualquer operação (Caras y Caretas, 2025; BBC Mundo, 2023).

 

Proteção Estatal, Filtrações e Operativos Frustrados

Em todos os países onde operou, a constante foi o acesso antecipado a informações sensíveis graças a funcionários cúmplices na polícia, migração, diplomacia e poder judiciário. Cada tentativa de captura foi frustrada por filtrações, permitindo que Marset mudasse de residência, destruisse provas e evadisse a justiça com a colaboração de sua rede e dos contatos mencionados, tanto na Colômbia quanto no Uruguai, Paraguai e Bolívia (OCCRP, 2025; El Clip, 2025).

 

A Nova Junta do Narcotráfico e o papel de Marset

A “Nova Junta do Narcotráfico”, denunciada oficialmente em 2025, é uma rede multinacional onde Marset figura como operador logístico-financeiro global. Outros líderes são Julio Lozano Pirateque, Jorge Iván González Ramírez “J la Firma”, Luis Cortés “Junior”, Luis Eduardo Méndez Bustos e Alejandro Salgado Vega, entre empresários e ex-militares distribuídos em clubes de futebol, mineração ilegal, segurança e entretenimento em mais de dez países. Marset facilita rotas, empresas de fachada e manuais de evasão digital e legal, garantindo a liquidez e proteção da organização diante da perseguição coordenada internacional.

 

Conclusão

O legado criminal de Marset ultrapassa a figura de um simples capo: representa a maturação do crime organizado sul-americano em uma rede poliédrica de alcance global. Seu sucesso reside em recrutar profissionais legais e financeiros de alto nível, estabelecer alianças com máfias e terroristas, e normalizar a corrupção e a lavagem em todos os níveis da economia formal. Em um mundo cada vez mais interconectado, sua capacidade de antecipar, adaptar-se e se proteger permitiu que sua organização burlasse Estados, agências de inteligência e marcos legais internacionais. Combater seu império é muito mais do que perseguir um fugitivo: é desmontar uma cultura narcocorporativa que, sob a aparência de legalidade, coloca em risco a estrutura da justiça, a governança e os sistemas democráticos na América Latina e no mundo todo.

Sobre o Autor:

William L. Acosta é graduado  pela PWU e pela Universidade da Aliança. É um oficial de polícia aposentado da polícia de Nova York, assim como fundador e CEO da Equalizer Private Investigations & Security Services Inc., uma agência com licença em Nova York e Florida, com projeção internacional.

Desde 1999, tem liderado investigações em casos de narcóticos, homicídios e pessoas desaparecidas, além de participar da defesa penal tanto em nível estadual quanto federal. Especialista em casos internacionais e multijurisdicionais, coordenou operações na América do Norte, Europa e América Latina.

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