12/05/2025 - politica-e-sociedade

O país mais jovem do mundo está quebrado: viver entre as ruínas, o caso do Sudão do Sul.

Por Uriel Manzo Diaz

O país mais jovem do mundo está quebrado: viver entre as ruínas, o caso do Sudão do Sul.

A pátria que nasceu cansada

Ninguém esperava que fosse fácil.
Mas ninguém pensou que seria tão impiedoso.

Quando Sudão do Sul celebrou sua independência em julho de 2011, a emoção transbordava nas ruas de Juba, a capital improvisada de um novo país. Bandeiras feitas à mão, cânticos, lágrimas: o sul-sudanês, após décadas de guerras civis, genocídios e deslocamentos, emergia como o país mais jovem do mundo.
Uma página em branco, diziam. Um futuro a ser escrito.

Treze anos depois, a história é outra.
Sudão do Sul está quebrado.
Quebrado pelas ambições de líderes que esqueceram seu povo. Quebrado pelo peso das armas, da fome, do medo. Quebrado por um mundo que o abandonou quando deixou de ser notícia.

Esta não é uma nota a mais.
É uma tentativa, apenas, de olhar além do esquecimento.
De contar o que acontece quando um país inteiro envelhece precocemente, quando a vida se torna mera resistência, e quando as promessas da história se chocam contra o barro.

Como se chega à ruína: história breve de um fracasso anunciado

Sudão do Sul nasceu de uma ferida: a marginalização e violência sofridas às mãos do norte sudanês, dominado por elites árabes muçulmanas, enquanto o sul, majoritariamente cristão e animista, era tratado como periferia de segunda classe.

O preço dessa independência foi altíssimo:

  • Duass guerras civis brutais (1955-1972 e 1983-2005).

  • Milhões de mortos.

  • Um sul devastado, sem infraestrutura ou Estado real.

A independência de 2011 não resolveu esses problemas.
Ela os transferiu, amplificados, para uma nova arena: a interna do próprio sul.
As divisões étnicas —especialmente entre os Dinka e os Nuer—, que antes se escondiam atrás de um inimigo comum, emergiram com força.
E os líderes que prometeram construir uma nação se entrincheiraram em seus próprios interesses, usando o poder como negócio e não como serviço.

Em dezembro de 2013, apenas dois anos após a independência, a guerra civil irrompeu.
Não era uma guerra de causas nobres. Era uma guerra de traições, ganância e ressentimentos.

O dia a dia no país que não decola

Viver no Sudão do Sul é como caminhar por um campo minado sem fim.
A rotina se constrói entre incertezas: Haverá comida amanhã? Será seguro ir ao supermercado? Poderei encontrar água potável?

  • Mais de 9 milhões de pessoas —75% da população— precisam de assistência humanitária.

  • Cerca de 2,3 milhões vivem como refugiados em países vizinhos.

  • Outros 2 milhões são deslocados internos, sem lar ou meios de subsistência.

A fome não é apenas um fenômeno sazonal. É um estado permanente.
A violência não é apenas um risco eventual. É uma condição estrutural.

Quando o esquecimento mata mais que balas

Sudão do Sul não tem a visibilidade midiática de outras crises.
Não há grandes campanhas internacionais. Não há cúpulas urgentes nem mobilizações massivas nas redes sociais.

O mundo se cansou do Sudão do Sul porque é uma tragédia longa, sem explosões dramáticas, sem mudanças rápidas.
É uma tragédia lenta, de corpos que se apagam como velas no meio da escuridão.

  • Menos fundos humanitários.

  • Menos pressão política.

  • Menos incentivos para a paz.

O resultado é que a vida no Sudão do Sul se tornou residual, como se valesse menos que a vida em outras partes do mundo.

Mulheres: as colunas que ainda sustentam o que resta

Enquanto os homens guerreiam, muitas mulheres sudanesas sustentam a vida com suas mãos.
Sob o peso da violência, da pobreza e da desesperança, as mulheres do Sudão do Sul são resistência viva.

  • Em campos de deslocados, organizam redes de cuidado comunitário.

  • Ensinam as crianças em salas de aula improvisadas feitas de galhos e lonas.

  • Mantêm pequenas hortas para alimentar dezenas de pessoas.

São histórias mínimas, invisíveis, mas heroicas.
Porque aqui, no país mais jovem do mundo, ser mulher significa lutar a cada dia contra a extinção da esperança.

A vida suspensa: uma reflexão sobre a existência sob a guerra

O que é viver quando tudo está quebrado?
Qual o sentido de construir sonhos em um país que não pode garantir um futuro, um amanhã?

No Sudão do Sul, a vida não segue linhas normais. Não há projetos a longo prazo. Não há certezas.
A vida se reduz a hoje: comer hoje, beber hoje, proteger-se hoje.

E, no entanto, mesmo ali, em meio ao barro, à fome e às armas, as pessoas riem quando podem.
As crianças brincam com bolas feitas de trapos. As mulheres cantam canções de suas aldeias.
A vida insiste, embora não tenha razões para fazê-lo.

O que isso nos diz, que vivemos em sociedades de certezas?
Que a vida não é uma promessa garantida.
Que a dignidade humana não depende da estabilidade econômica ou da segurança política.
Que mesmo nas ruínas, o ser humano busca, de alguma forma, continuar sendo humano.

Existe um amanhã para o Sudão do Sul?

A pergunta não é retórica.
Com eleições programadas —mais uma vez adiadas—, com acordos de paz que não são cumpridos como rotina, com uma economia dependente do petróleo e um Estado frágil, o futuro do Sudão do Sul pende por um fio.

Alguns fatores que definirão o destino do país:

  • Integração real de grupos armados no processo político.

  • Investimento internacional sustentado em infraestrutura e educação.

  • Reconciliação étnica profunda, que não se realize apenas no papel, mas na prática diária.

  • Compromisso político verdadeiro das elites sudanesas, além da distribuição de poder.

Hoje parece utópico. Mas pensar no Sudão do Sul apenas como uma tragédia sem remédio seria cometer o mesmo erro que o mundo cometeu tantas vezes: o erro de se resignar.

O direito à esperança

Sudão do Sul não é apenas um Estado falido.
É um espelho incômodo: nos mostra o que acontece quando a política esquece sua função mais básica —proteger e dar sentido à vida das pessoas—.

Não é tarde demais. Não deveria ser.
Cada criança que brinca entre o barro, cada mulher que cultiva uma pequena parcela de terra, cada jovem que ainda sonha em estudar, é uma prova de que o país mais jovem do mundo não morreu ainda.

Está quebrado.
Sim.
Mas enquanto houver quem resista, enquanto houver quem se recuse a cair, Sudão do Sul ainda tem direito à sua esperança.

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Uriel Manzo Diaz

Uriel Manzo Diaz

Olá! Meu nome é Uriel Manzo Diaz, atualmente estou em processo de aprofundar meus conhecimentos em relações internacionais e ciências políticas, e planejo começar meus estudos nesses campos em 2026. Sou apaixonado por política, educação, cultura, livros e temas internacionais.

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