Jesus Daniel Romero e William Acosta do Miami Strategic Intelligence Institute para Poder & Dinero e FinGurú
No dia 21 de março de 2025, os Estados Unidos proibiram a entrada no país da ex-presidente argentina Cristina Fernández de Kirchner, argumentando sua implicação em casos de corrupção durante seu mandato (Reuters, 2025). A medida, anunciada pelo secretário de Estado Marco Rubio, também afeta seus familiares diretos e ex-funcionários como Julio Miguel De Vido, vinculado a subornos em contratos de obra pública. Embora Washington a apresente como parte de sua luta anticorrupção (U.S. Department of State, 2024), o timing desperta suspeitas, especialmente após o escândalo da criptomoeda Libra, que levantou dúvidas sobre as intenções por trás de ações como esta (El País Argentina, 2025). É um gesto genuíno ou uma manobra estratégica para fortalecer o presidente Javier Milei e reconfigurar a política argentina?
Milei Contra o Kirchnerismo: Um Contexto de Ruptura
Milei, anarcocapitalista e crítico implacável do kirchnerismo, centrou seu governo em combater a corrupção e liberalizar a economia desde que assumiu em dezembro de 2023 (Rodríguez, 2024). Sua aposta em romper com as políticas de esquerda o levou a estreitar laços com o Ocidente, como ficou claro em sua recente visita à Conservative Political Action Conference (CPAC) em Washington, onde se reuniu com Donald Trump e figuras-chave do Partido Republicano (Reuters, 2025). Nesse contexto, a sanção a Fernández de Kirchner parece alinhar-se com seus interesses. Embora não haja evidências diretas de que ele a tenha incentivado, o efeito é claro: enfraquece sua maior adversária e reforça seu discurso de que o kirchnerismo é a raiz da crise econômica e moral do país.
Um Golpe Político ao Kirchnerismo
A proibição transcende o simbolismo: dificulta que o kirchnerismo se reorganize como uma oposição sólida. Para Milei, que o acusa de décadas de corrupção, essa medida internacional dá peso ao seu discurso (Rodríguez, 2024). No entanto, o impacto poderia voltar-se contra ele. Fernández de Kirchner, apesar de sua condenação no caso Vialidad (ratificada em 2024, mas ainda apelável), mantém uma base leal e acusou Milei de orquestrar a sanção, um argumento que poderia reavivar o peronismo e gerar críticas por ingerência estrangeira, ainda mais após as dúvidas levantadas pelo escândalo da Libra (El País Argentina, 2025).
Geopolítica e Suspeitas: O Fantasma da Libra
O fundo geopolítico é crucial. Diante do avanço da China na América Latina, Washington busca aliados alinhados com o Ocidente, e Milei, crítico de Pequim e do socialismo, se encaixa nesse papel (U.S. Department of State, 2024). A sanção a Kirchner não só mira a corrupção: sinaliza que o futuro político da Argentina deve se afastar do kirchnerismo, fortalecendo uma aliança que pode trazer benefícios econômicos, como um acordo favorável com o Fundo Monetário Internacional (FMI), ao qual o país deve 44 bilhões de dólares (Reuters, 2025). No entanto, a recente controvérsia sobre a Libra, a criptomoeda promovida por empresas americanas e questionada por seu potencial para lavar dinheiro e desestabilizar economias, acrescenta uma camada de suspeita (El País Argentina, 2025). Para alguns, a medida contra Kirchner pode ser menos um ato de justiça e mais uma jogada para consolidar influência na região, usando a corrupção como pretexto.
Sanciones Mais Duras no Horizonte?
Embora a medida se limite por enquanto à proibição de entrada, o congelamento de ativos não é improvável. Isso exigiria que Fernández de Kirchner tivesse fundos em bancos americanos ou vinculados aos EUA, provas de origem ilícita e uma ordem do Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC). Casos como Nicolás Maduro, oligarcas russos ou o ex-presidente hondurenho Juan Orlando Hernández mostram que Washington age quando há evidência (U.S. Treasury, 2023). Novas provas, pressão política nos EUA ou colaboração de Milei poderiam precipitar isso, mas a falta de ativos ou o risco de tensões diplomáticas poderiam frear, deixando o caso à justiça argentina.
Um Empurrão para a Reeleição de Milei?
Poderiam essas sanções abrir caminho para Milei em um segundo mandato em 2027? Para sua base, a medida valida sua cruzada anticorrupção e poderia mobilizar eleitores cansados do kirchnerismo, principalmente com vista às legislativas de outubro de 2025, um teste crucial para sua gestão (Rodríguez, 2024). Mas sua reeleição dependerá mais da economia do que desse triunfo simbólico. Embora tenha conseguido reduzir a inflação (de 210% em 2023 a níveis mais baixos em 2024) com medidas como a desvalorização e cortes de subsídios, a pobreza supera os 50% e o poder aquisitivo continua caindo (Reuters, 2025). Sem melhorias concretas, nem o apoio dos EUA nem as suspeitas sobre a Libra compensarão o descontentamento social.
A oposição também desempenhará seu papel. O kirchnerismo poderia se reagrupar se Fernández de Kirchner transformar a sanção em um ataque externo, enquanto forças como Juntos por el Cambio poderiam capitalizar uma polarização que deixe espaço para os moderados. Além disso, a aliança com Trump e os EUA, embora útil, poderia afastar setores nacionalistas se vista como submissão, um temor que o escândalo da Libra poderia amplificar (El País Argentina, 2025).
Conclusão: Um Jogo Sob Scrutínio
Seja um gesto anticorrupção ou uma manobra calculada, a sanção a Fernández de Kirchner abala o tabuleiro argentino. Ao enfraquecer o kirchnerismo, fortalece Milei e estreita seus laços com os EUA, abrindo uma nova etapa nas relações bilaterais. No entanto, o eco do escândalo da Libra convida a questionar as intenções de Washington (El País Argentina, 2025), enquanto o impacto na reeleição de Milei dependerá de traduzir esse apoio em resultados tangíveis. Por enquanto, oferece um argumento de campanha e uma respiração política, mas seu futuro e o do país ainda estão atrelados à economia e à paciência de uma sociedade esgotada após décadas de crise.
Referências:
● El País Argentina. (2025, 18 de fevereiro). O escândalo da criptomoeda $Libra coloca Milei diante de sua pior crise em mais de um ano de governo.https://elpais.com/argentina/2025-02-18/libra-escandalo-milei.html
● Reuters. (2025, 21 de março). Os EUA proíbem Cristina Fernández de Kirchner da Argentina devido a alegações de corrupção.https://www.reuters.com/world/americas/us-bans-cfk-2025-03-21/
● Rodríguez, M. (2024). Javier Milei e a ruptura com o kirchnerismo: Uma análise de seu projeto político. Revista Argentina de Ciências Políticas, 15(2), 89-112.
● U.S. Department of State. (2024). Prioridades de política externa na América Latina: Combatendo a corrupção e a influência. Escritório de Impressão do Governo dos EUA.
● U.S. Treasury. (2023). Sanciones OFAC: Uma história de ações de fiscalização.https://www.treasury.gov/ofac/reports/2023-enforcement
Sobre os Autores
William L. Acosta: Graduado Magna Cum Laude da PWU e da Universidade de Alianza. Oficial de polícia aposentado de Nova York e fundador da Equalizer Private Investigations & Security Services Inc. Desde 1999, tem conduzido investigações sobre narcóticos, homicídios e pessoas desaparecidas, participando na defesa penal estadual e federal. Especialista em casos internacionais, coordenou operações na América do Norte, Europa e América Latina.
Jesús D. Romero: Graduado Magna Cum Laude da Universidade Estadual de Norfolk. Oficial aposentado do serviço de inteligência da Marinha dos EUA e de Operações de Inteligência do Exército com 37 anos de serviço. Trabalhou na indústria de defesa com a British Aerospace Systems e a Booz Allen Hamilton. Comandou uma unidade da Agência de Inteligência de Defesa no Panamá e supervisionou operações no Caribe, América Central e América do Sul. Membro e cofundador do Miami Strategic Intelligence Institute. Autor best-seller na Amazon e comentarista em rádio, televisão e meios impressos. Membro e cofundador do grupo de especialistas do Miami Strategic Intelligence Institute.
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