31/10/2024 - politica-e-sociedade

A violência na política, uma marca de época no ocidente

Por Tobias

A violência na política, uma marca de época no ocidente

Evo Morales, Donald Trump Cristina Kirchner e Jair Bolsonaro, vítimas da violência política.

Nos últimos anos, a segurança pessoal dos líderes políticos se deteriorou, tendência que começou com o ataque a Jair Bolsonaro, seguiu-se da tentativa de assassinato de Cristina Kirchner e culminou neste fim de semana com o atentado contra Evo Morales. Enquanto isso, a violência na sociedade, que acompanha essa tendência, se manifestou, por exemplo, nos ataques a imigrantes muçulmanos no último agosto no Reino Unido. Todo esse coquetel se dá no contexto de uma profunda crise de identidade no Ocidente, onde os valores democráticos de pluralismo e tolerância estão sendo erosionados. 

Crise de representação e Polarização no Ocidente

Nos Estados Unidos, a polarização política está alcançando níveis preocupantes. No contexto das eleições, as pesquisas revelam que 54% dos republicanos acreditam que haverá uma guerra civil nesta década e 41% dos democratas concordam. Números que se exacerbam diante de eventos como os dois atentados contra Donald Trump, ou a crença enraizada entre os eleitores republicanos de que existem possibilidades de uma fraude eleitoral em massa nas eleições da próxima terça-feira. 

A invasão do Capitólio em janeiro de 2021 foi um claro indicador dessa intolerância que não para de crescer nos Estados Unidos. Todos temos em mente como os apoiadores de Donald Trump tentaram impedir a certificação dos resultados eleitorais, revelando a crescente desconfiança dos cidadãos em relação às instituições do país. Este fato se torna ainda mais alarmante diante da possibilidade de que, se o partido republicano perder novamente as eleições, a desconfiança e a dúvida sobre a veracidade dos resultados eleitorais poderiam desencadear uma crise semelhante ou, potencialmente, nos mergulhar em um terreno desconhecido e perigoso para a estabilidade democrática da primeira potência do mundo.

A Europa não tem estado isenta de violência política. Apesar de suas instituições promoverem o multiculturalismo e a tolerância, a violência e a polarização também afetaram o velho continente. Nos meses de julho e agosto, o Reino Unido foi abalado por um assassinato em massa cometido por um afrodescendente. A situação se agravou quando nas redes sociais começaram a circular rumores afirmando que o assassino era um imigrante ilegal de origem muçulmana. Desencadeando o caos nas ruas do Reino Unido, onde manifestantes, atacando a polícia, exibiram sua xenofobia ao assaltar um hospital dedicado ao atendimento de imigrantes. Em alguns meios de comunicação internacionais, este evento foi comparado à Kristallnacht (Noite de Cristais Quebrados) na Alemanha. No entanto, o assassino não era muçulmano nem imigrante, mas uma pessoa de segunda geração de migrantes, ou seja, um inglês.

A América Latina não fica para trás. O ciclo de violência política começou com uma facada em Jair Bolsonaro durante sua campanha eleitoral em 2018, um incidente que abalou a campanha brasileira de 2018. A isso seguiu-se a tentativa de assassinato contra Cristina Kirchner em 2022, outra imagem para  a coleção que ficou esquecida após imagens tão drásticas como sacos mortuários e guilhotinas na Praça de Maio. Nesse mesmo ano, o Brasil experimentou uma de suas campanhas presidenciais mais violentas dos últimos tempos, com um saldo trágico de 40 pessoas falecidas, destacando a intensidade dos conflitos políticos. Além disso, o assassinato de Fernando Villavicencio, candidato à presidência do Equador, marcou o primeiro atentado bem-sucedido nesta longa e trágica lista de incidentes. 

As redes sociais e a pauperização da pós-pandemia

Muitos analistas destacaram o papel das redes sociais no recrudescimento da violência que transita do âmbito virtual ao real. No entanto, é importante considerar que, além de seu papel como plataformas de comunicação, as redes sociais também expressam as frustrações de uma sociedade ocidental cuja qualidade de vida foi significativamente afetada pelas restrições durante a pandemia.

Essas restrições causaram crises econômicas nos países em desenvolvimento e intensificaram as tendências migratórias que já existiam antes da pandemia. Atualmente, na União Europeia, debate-se abertamente sobre a criação de campos de realocação em terceiros países, como a Albânia, onde os migrantes deveriam permanecer enquanto seus trâmites migratórios são processados. Esse contexto exacerbou manifestações de xenofobia e racismo, que encontraram nas redes sociais um terreno fértil para seu crescimento.

Além disso, a inflação e o aumento do custo de vida e da energia após a invasão russa na Ucrânia pioraram as condições de vida, intensificando a frustração e a busca por culpados diante desse contexto difícil. Pela primeira vez na história do Reino Unido, a BBC informou sobre cidadãos que foram obrigados a omitir refeições devido à crise inflacionária.

As novas caras da Polarização

A violência política no Ocidente reflete uma profunda crise de identidade e representação, exacerbada por uma série de fatores socioeconômicos e culturais. Os ataques contra líderes políticos e cidadãos na América Latina, Estados Unidos e Europa evidenciam uma polarização e uma desconfiança crescente em relação às instituições democráticas, enquanto as redes sociais atuam como amplificadores desse descontentamento. A isso se soma a pressão das crises econômicas pós-pandemia e a gestão dos fluxos migratórios, que intensificam a xenofobia e o racismo. Este panorama, complexo e multifacetado, desafia os valores de pluralismo e tolerância que historicamente têm definido as democracias ocidentais, apresentando um desafio crucial para a estabilidade e a coesão social em um mundo cada vez mais interconectado.


Deseja validar este artigo?

Ao validar, você está certificando que a informação publicada está correta, nos ajudando a combater a desinformação.

Validado por 0 usuários
Tobias

Tobias

Sou Tobías Belgrano, analista político e consultor especializado na América Latina e no Sul Global. No Austral Education Group, projeto programas acadêmicos internacionais junto a universidades de todo o mundo. Sou apaixonado por construir pontes entre culturas e contextos: trabalhei na Argentina, Taiwan, Itália e Estados Unidos, e colaboro regularmente com mídias e think tanks internacionais. Se você está interessado em política global, educação internacional ou em entender melhor as dinâmicas do Sul Global, convido-o a ler meus artigos e análises. Bem-vindo!

Linkedin

Visualizações: 12

Comentários

Podemos te ajudar?