A ideia do presente artigo é que sirva como gatilho para que o leitor se questionasse e se pergunte quais acreditam que são as vantagens e quais os possíveis conflitos que poderia trazer a correspondência da inclusão desta tecnologia frente à delicada tarefa que os juízes têm nos processos judiciais em que a fortuna, a integridade e a vida de uma pessoa podem estar em jogo.
Longo e tendenciou-se no âmbito jurídico sobre a influência e utilidade da inteligência artificial e a forma como a realidade humana penetrou e, especificamente, a realidade jurídica como uma possível ferramenta que facilite os longos e complexos processos judiciais. E não se esperava algo diferente entre a comunidade jurídica que incerteza, por parte dos advogados e juízes, que com medo e incertezas se animam a falar do que a revolução tecnológica depara para o exercício privado da profissão, e com muito mais protagonismo no âmbito público judicial.
Para começar a desenvolver o tema e tentar entender se realmente esta tecnologia pode ou não substituir a análise crítica e o pensamento contextualizado do juiz, convém fazer uma aproximação ao conceito do que se entende por inteligência artificial e de que forma opera.
Em termos simples, a inteligência artificial (IA) é um sistema que combina a informática e os dados para a resolução de diferentes problemas e situações. Tentando imitar assim, as capacidades humanas de tomar decisões. A IA usa dados para interpretá-los e formular decisões frente a diversas situações. Estes dados são interpretados e ordenados através dos algoritmos que são os que fornecem as instruções adequadas para que a máquina analise, interprete e ordene. A pergunta que podemos fazer agora é
Os algoritmos podem tomar decisões que são delegadas a um juiz num processo judicial?
Se entrarmos na tarefa do juiz na resolução de um caso, sabemos que, ao contrário do que pensa o comum das pessoas, o direito não é estático, mas sim dinâmico e flexível e os pressupostos que contemplam as regras devem ser apreciados na sua totalidade e tendo em conta os factores circunstanciais e particulares do caso (contexto social, económico e cultural, elementos subjetivos, etc). Então, a pergunta que se pode fazer é o algoritmo “pensar” soluções tendo em conta esses elementos subjetivos e contextuales de cada caso em particular?Diversas opiniões e posturas surgiram a este questionamento. Por um lado, especialistas entendem que poderia identificar fatores circunstanciais que modifiquem ou afetem de alguma forma a decisão no caso concreto, através da análise exaustiva de casos e jurisprudência análoga onde se possam identificar e utilizar soluções semelhantes a casos semelhantes, ou seja, através da análise de dados. Mas esta possibilidade leva-nos a perguntar-nos o que é tão seguro? São sempre os dados reflexos exatos da realidade?
Imaginemos que estamos num país europeu em que a maioria da sua população carcerária seja pessoas de origem latina, que infelizmente existem, e suponhamos que, face a um caso concreto, o algoritmo deve determinar se a pessoa ou não é culpado do crime pelo qual a imputa. O algoritmo procederá a uma análise de dados jurisprudênciais de casos anteriores semelhantes e procurará dados que o ajudem a formular uma decisão que considere adequada. Poderia dizer-se que o algoritmo tem altas probabilidades de cair sob um viés cognitivo? E os preconceitos de gênero? Será que os dados que você encontra e analise poderiam resolver integralmente o caso particular que lhe é apresentado? Seria justo?
Definitivamente, em mais de uma ocasião poderíamos nos encontrar sob viéss que tornem injusta a decisão, pois então, não representaria uma vantagem para o sistema judicial, pelo menos não até que a IA seja capaz de superá-lo.
Ora, este e muitos outros questionamentos podem ser feitos em torno do uso da inteligência artificial em áreas tão sensíveis e complexas como as decisões que dia a dia tomam os juízes e que repercutem em forma direta no patrimônio ou na vida de uma pessoa. Consideremos não só os preconceitos, mas também a manipulação de dados e as especificidades específicas que cada caso apresenta. Pois os conflitos humanos que chegam ao julgamento de um juiz costumam não ser tão simples quanto se acredita.
Mas, para não deixar de lado os enormes benefícios da IA, convém salientar que é uma grande ferramenta para simplificar tarefas e procedimentos não tão complexos e que repercutem de maneira positiva na rapidez e agilidade dos processos. A lentidão da justiça e a necessidade de enchicar os custos de transação colocam a IA como a ferramenta chave que o sistema de justiça precisa e que deve incluir em sua organização tarde ou cedo.
A Argentina já começou a utilizar este tipo de tecnologia no âmbito judicial, especialmente em tarefas que representam tediosas perdas de tempo e que a IA resolve em questão de segundos. Estamos, sem dúvida, perante um grande aliado que, não vem substituir, mas complementar, facilitar e agilizar e que convém conhecer e explorar o seu inúmeras utilidades.
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